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Jamil Chade

REPORTAGEM

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Parlamento Europeu: Bolsonaro tem "responsabilidade pessoal" por ataques

Bandeiras dos países membros da União Europeia do lado de fora do Parlamento Europeu - Getty Images
Bandeiras dos países membros da União Europeia do lado de fora do Parlamento Europeu Imagem: Getty Images

Colunista do UOL

18/01/2023 16h34

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O ex-presidente Jair Bolsonaro tem "responsabilidade pessoal" pelos ataques contra Brasília e os instigadores dos atentados contra as sedes dos três Poderes precisam ser punidos. Essas foram algumas das declarações feitas hoje, num intenso debate no Parlamento Europeu, convocado para lidar com a crise política brasileira e sinalizar apoio ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

"Falo para você, Bolsonaro, que a invasão das instituições democráticas no Brasil é sua responsabilidade pessoal. Com seus ataques contra a democracia, com suas mentiras, a difusão do ódio e a tentativa de dividir a sociedade", disse a deputada Anna Cavazzini, autora da convocação do debate e apoiada por centenas de outros parlamentares. Segundo ela, se alguém brinca com fogo, um incêndio é possível. "Se você espalha mentiras por meses sobre eleições, que elas seriam roubadas, não atue como se estivesse surpreso se as instituições democráticas literalmente peguem fogo", denunciou.

Na avaliação da deputada Marisa Matias, o processo golpista no Brasil "ainda não terminou" e continuam os esforços da extrema direita para a desestabilização do país.

A parlamentar Maria-Manuel Leitão Marques insistiu sobre a necessidade de que a investigação descubra quem ordenou as invasões. "Precisamos saber quem estava por trás disso", alertou.

O debate foi marcado por um amplo apoio à democracia e o reconhecimento de Lula como único Poder Executivo legítimo no país. Mas a reunião ainda foi tomada por um alerta generalizado sobre o fato de a extrema direita ser, hoje, uma ameaça globalizada.

"Há um vírus", denunciou Maria-Manuel, apontando para uma crise global com a extrema direita."Cuidado com os homens fortes", disse o deputado Thomas Waitz. "Eles falam em liberdade e que atuam pelo povo. Mas só querem o poder", disse, numa referência a vários grupos de extrema direita da Europa.

Para o deputado Francisco Guerreiro, os acontecimentos no Brasil mostram que a extrema direita está intensificando sua violência.

Ofensiva democrática

Vários deputados ainda sugeriram que, diante dos acontecimentos no Brasil e, em 2021, nos EUA, há uma necessidade real de se construir alianças entre democracias. Katalin Cseh, deputada húngara, pediu que os europeus "abram os olhos". "Isso (extrema direita) é movimento global. E precisamos de movimento global para barrá-los", disse.

Samira Rafaela também apontou na mesma direção, insistindo em uma cooperação entre democracias que impeça que tais acontecimentos se repitam em outras partes do mundo. "A democracia esta sob ataque em todo o mundo" disse.

Um amigo de Bolsonaro

Uma única voz surgiu para destoar dos diversos discursos. Quem cumpriu esse papel foi Hermann Tertsch, deputado da extrema direita espanhola VOX, partido aliado da família Bolsonaro. Para ele, foram os apoiadores de Lula quem incendiaram três ministérios no passado. Ele ainda acusou o atual presidente de fazer parte de uma "rede narcocomunista" e que "tenta minar a democracia, ao lado de (Fidel) Castro". Repetindo à risca o discurso bolsonarista, o deputado europeu afirmou que "a real ameaça é o Foro de São Paulo".

O que acontece agora?

Uma moção será colocada em votação pelo Parlamento, num processo que será concluído apenas na quinta-feira. Mas conforme o UOL apurou, um acordo entre alguns dos principais partidos europeus garantirá uma maioria para aprovar a resolução.

O texto não tem o poder de lei. Mas amplia o isolamento internacional do ex-presidente brasileiro e cria um constrangimento político sobre qualquer membro da Europa que possa avaliar acolher Bolsonaro.

Quem patrocina a resolução?

  • Um deles é a segunda maior força dentro do Legislativo, a Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas. Só esse grupo conta com 145 votos, entre os 705 deputados do Parlamento.
  • Também apoia o texto o Renew Group, força liberal com 104 votos no Parlamento.
  • 38 votos dos Partidos de Esquerda ainda estão assegurados.
  • A iniciativa partiu dos partidos ecologistas que formam uma aliança no Legislativo europeu. Com 71 votos, eles são liderados no debate sobre o Brasil pela deputada Anna Cavazzini.

"O Parlamento Europeu condena os atos antidemocráticos de violência e ocupação ilegal das instituições em Brasília pelo apoiadores de extrema direita do ex-presidente Jair Bolsonaro", disse a parlamentar ecologista.

Entre as principais conclusões do texto, os deputados europeus indicarão que tanto Donald Trump como Jair Bolsonaro "tiveram um papel instrumental" nos ataques contra o Capitólio e contra Brasília, respectivamente.

Os deputados vão denunciar a violência da extrema direta e aliados de Bolsonaro, além de mencionar a prisão do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres.

Outro aspecto é a de alertar sobre o fato de que os "ataques violentos contra instituições democráticas pela extrema direita passaram a ser um fenômeno global", além de citar o "fracasso" das redes sociais em moderar ou limitar a difusão de campanhas antidemocráticas, o "fascismo transacional e extremismo".

Segundo eles, algoritmos que promovem conteúdo odioso e desinformação e uma relutância em remover conteúdo ilegal "desempenharam um papel fundamental nesses eventos ao amplificar a retórica agressiva e a violência e ao facilitar a mobilização e a disseminação da desinformação".

O que mais diz a resolução?

1. Condena nos termos mais fortes as ações criminosas perpetradas pelos apoiadores do ex-presidente Bolsonaro e apoia os esforços em andamento para assegurar uma investigação rápida, imparcial, adequada e eficaz a fim de identificar, processar e responsabilizar todos os envolvidos, incluindo os instigadores, organizadores e financiadores, bem como as instituições estatais que não agiram para evitar estes ataques;

2. Expressa solidariedade com o presidente democraticamente eleito Lula da Silva, seu governo e instituições brasileiras;

3. Lamenta as tentativas do ex-presidente Bolsonaro e de alguns de seus apoiadores políticos de desacreditar o sistema de votação e as autoridades eleitorais, apesar de não haver evidência de fraude eleitoral, e insta-os a aceitar o resultado democrático das eleições;

4. Reconhece a conexão entre o fascismo transnacional crescente, o racismo, o extremismo e, entre outros, os acontecimentos em Brasília, a invasão do Capitólio dos EUA em janeiro de 2021 e as prisões em dezembro de 2022, referentes a um ataque planejado ao Bundestag da Alemanha;

5. Destaca que o Supremo Tribunal aprovou um pedido do Ministério Público Federal para investigar o ex-presidente Bolsonaro, pois ele "pode ter contribuído, de forma muito relevante, para a ocorrência de atos criminosos e terroristas"; e expressa preocupação com os atos e omissões dos funcionários públicos, em particular do Governador e da Polícia Militar do Distrito Federal;