Jamil Chade

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Reportagem

Marcado por tragédias climáticas, 2024 deve ser ano mais quente da história

Valência, Porto Alegre, Amazônia e bilhões de dólares de danos causados por furações nos EUA. Este ano de 2024 caminha para ser o mais quente da história, com um profundo impacto sobre populações e para a economia.

A constatação faz parte do relatório anual da Organização Meteorológica Mundial, uma agência da ONU. O alerta é soado no começo da COP29, diante de uma sequência de meses que bateram recorde de temperatura. Para os cientistas, a meta do Acordo de Paris de evitar que não haja uma elevação dos termômetros para mais de 1,5º Celsius está ameaçada.

A agência da ONU, portanto, decidiu emitir um "sinal vermelho", inclusive por conta da intensificação de desastres naturais e eventos extremos. Um deles citado pela ONU foi as enchentes no Rio Grande do Sul, no começo do ano. Mas o informe também destaca a seca nos grandes rios, como na Amazônia.

A constatação é que 2023 já foi o ano mais seco para os "grandes rios globais" nas últimas três décadas, enquanto os últimos cinco anos registraram a pior condição desses locais, com um profundo impacto para o abastecimento de água para milhões de pessoas.

"O mundo inteiro está impressionado com o ritmo acelerado das mudanças climáticas em uma única geração, impulsionado pelos níveis cada vez maiores de gases de efeito estufa na atmosfera", afirmou a agência.

Os anos de 2015 a 2024 serão os dez mais quentes já registrados; a perda de gelo das geleiras, o aumento do nível do mar e o aquecimento dos oceanos estão se acelerando; e o clima extremo está causando estragos em comunidades e economias em todo o mundo.
Trecho de relatório anual da Organização Meteorológica Mundial

Para a secretária-geral da agência, Celeste Saulo, "os recordes de chuvas e inundações, a rápida intensificação de ciclones tropicais, o calor mortal, a seca implacável e os incêndios florestais devastadores que vimos em diferentes partes do mundo este ano são, infelizmente, nossa nova realidade e um prenúncio do nosso futuro".

"Precisamos urgentemente reduzir as emissões de gases de efeito estufa e fortalecer nosso monitoramento e compreensão das mudanças climáticas. Precisamos intensificar o apoio à adaptação às mudanças climáticas por meio de serviços de informações climáticas e alertas antecipados para todos", disse.

A catástrofe climática está afetando a saúde, ampliando as desigualdades, prejudicando o desenvolvimento sustentável e abalando os alicerces da paz. Os vulneráveis são os mais atingidos.
António Guterres, secretário-geral da ONU

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Para 2024, essas são as principais conclusões dos cientistas:

  • temperatura média global de janeiro a setembro de 2024 foi de 1,54 °C acima do nível pré-industrial;
  • o aquecimento de longo prazo medido ao longo de décadas permanece abaixo de 1,5 °C;
  • os últimos 10 anos são os mais quentes já registrados e o calor dos oceanos aumenta;
  • o gelo marinho da Antártida é o segundo mais baixo já registrado e a perda de geleiras se acelera;

Eventos climáticos e meteorológicos extremos levam a enormes perdas econômicas e humanas. Segundo a ONU, esses eventos prejudicaram o desenvolvimento sustentável em todas as áreas, piorando a insegurança alimentar e exacerbando o deslocamento e a migração. O calor perigoso afligiu muitos milhões de pessoas em todo o mundo. Precipitações intensas, enchentes e ciclones tropicais causaram enormes perdas de vidas e danos.

Temperaturas e ameaça às metas do Acordo de Paris

Um dos destaques do informe se refere ao calor. Segundo o informe, a temperatura média global em 2024 "está a caminho de superar a temperatura até mesmo de 2023, o ano mais quente". "Por 16 meses consecutivos (junho de 2023 a setembro de 2024), a temperatura média global provavelmente excedeu tudo o que foi registrado antes, e muitas vezes por uma ampla margem", disse a agência.

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A temperatura média global do ar na superfície de janeiro a setembro de 2024 foi 1,54 °C acima da média pré-industrial, impulsionada por um evento de aquecimento do El Niño.

O documento destaca que um ou mais anos individuais que excedam 1,5°C não significam necessariamente que "prosseguir com os esforços para limitar o aumento da temperatura a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais", conforme declarado no Acordo de Paris, esteja fora de alcance.

A ultrapassagem dos níveis de aquecimento mencionados no Acordo de Paris deve ser entendida como uma ultrapassagem em um período prolongado, normalmente décadas ou mais.

Mesmo assim, o informe destaca que as ambições do Acordo de Paris estão em "grande perigo".

"Como o aquecimento mensal e anual ultrapassou temporariamente 1,5°C, é importante enfatizar que isso não significa que não conseguimos cumprir a meta do Acordo de Paris de manter o aumento da temperatura média global da superfície a longo prazo bem abaixo de 2°C acima dos níveis pré-industriais e buscar esforços para limitar o aquecimento a 1,5°C", disse Celeste Saulo.

A chefe da agência explicou que as anomalias de temperatura global registradas em escalas de tempo diárias, mensais e anuais são propensas a grandes variações, em parte devido a fenômenos naturais como El Niño e La Niña. Elas não devem ser equiparadas à meta de temperatura de longo prazo estabelecida no Acordo de Paris, que se refere aos níveis de temperatura global sustentados como uma média ao longo de décadas.

É essencial reconhecer que cada fração de um grau de aquecimento é importante. Seja em um nível abaixo ou acima de 1,5°C de aquecimento, cada incremento adicional de aquecimento global aumenta os extremos climáticos, os impactos e os riscos.
Celeste Saulo, secretária-geral da Organização Meteorológica Mundial

Emissões

O informe ainda apontam que os gases de efeito estufa atingiram níveis recordes em 2023 e que continuam a aumentar em 2024. "A concentração atmosférica de dióxido de carbono (CO2) aumentou de cerca de 278 ppm em 1750 para 420 ppm em 2023, um aumento de 51%. Isso retém o calor e faz com que as temperaturas aumentem", disse.

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Temperatura do mar

O conteúdo de calor do oceano em 2023 foi o mais alto já registrado e os dados preliminares mostram que 2024 continuou em níveis comparáveis. As taxas de aquecimento do oceano mostram um aumento particularmente forte nas últimas duas décadas. De 2005 a 2023, o oceano absorveu, em média, aproximadamente 3,1 milhões de terawatts-hora (TWh) de calor por ano. "Isso representa mais de 18 vezes o consumo mundial de energia em 2023", destacou o informe.

"Cerca de 90% da energia acumulada no sistema terrestre está armazenada no oceano e, portanto, espera-se que o aquecimento do oceano continue - uma mudança irreversível em escalas de tempo centenárias a milenares", alertou.

A consequência também tem sido o aumento do nível do mar que "está se acelerando devido à expansão térmica das águas mais quentes e ao derretimento das geleiras e das camadas de gelo".

"De 2014 a 2023, o nível médio global do mar subiu a uma taxa de 4,77 mm por ano, mais do que o dobro da taxa entre 1993 e 2002. O efeito do El Niño fez com que ele crescesse ainda mais rapidamente em 2023. Os dados preliminares de 2024 mostram que, com o declínio do El Niño, ele voltou a cair para níveis compatíveis com a tendência de aumento de 2014 a 2022", apontou.

Geleiras

O informe ainda alerta que a perda das geleiras está se intensificando. "Em 2023, as geleiras perderam um recorde de 1,2 metro de água equivalente de gelo - cerca de cinco vezes a quantidade de água no Mar Morto", afirmou.

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"Essa foi a maior perda desde que as medições começaram em 1953 e se deveu ao derretimento extremo na América do Norte e na Europa. Na Suíça, as geleiras perderam cerca de 10% de seu volume restante em 2021/2022 e 2022/2023", disse.

A extensão do gelo marinho na Antártida - tanto o mínimo anual em fevereiro quanto o máximo em setembro - foi a segunda mais baixa no registro de satélite (1979-2024) após 2023. A extensão mínima do gelo marinho do Ártico após o derretimento do verão foi a sétima mais baixa no registro de satélite e a máxima ficou um pouco abaixo da média de longo prazo de 1991-2020.

Reportagem

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