Jamil Chade

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Opinião

Extrema direita se articula e gera temor de fuga de Bolsonaro a embaixadas

Numa postagem em suas redes sociais neste fim de semana, o deputado Eduardo Bolsonaro tentou criar um paralelo entre a ditadura chavista, na Venezuela, e o indiciamento de seu pai, o ex-presidente indiciado por tentativa de golpe de Estado, Jair Bolsonaro.

A intenção era a de reforçar, para a extrema direita mundial, a teoria da existência de uma suposta ditadura de esquerda no Brasil.

Um dia antes, foi outro indiciado pela Polícia Federal, Paulo Figueiredo, quem escreveu nas redes sociais de Elon Musk —onde tudo é permitido— sua versão da realidade paralela que seu movimento alimenta: a de que vive uma perseguição injusta.

Ao se apresentar em inglês e numa tentativa de criar uma narrativa aos estrangeiros, ele fala do avô famoso. Mas esqueceu de dizer que seu antepassado era um ditador: João Figueiredo. Aquele que amava os cavalos.

O neto agora diz que se sente "honrado" por ter sido indiciado. "Entendo essa acusação como parte de uma campanha de intimidação da GESTAPO de Mores para silenciar a mim e aos meus esforços para conscientizar o público e o governo americanos sobre a contínua queda do Brasil na ditadura, que está se alinhando cada vez mais com a China", escreveu.

"Que fique claro: não respondo a intimidações, nem recuarei no exercício de minhas liberdades dadas por Deus", disse, em tom desafiador.

Mas é sua última frase que chamou a atenção de muitos em Brasília:

"Estou confiante de que, sob uma nova administração que valoriza a liberdade, os Estados Unidos verão esses acontecimentos com a seriedade que merecem".

Trump apenas chega ao poder no dia 20 de janeiro de 2025. Bolsonaro hoje não tem acesso a seu passaporte. Mas já mostrou que gosta de dormir em embaixadas estrangeiras, como ocorreu em sua visita prolongada e jamais explicada na representação da Hungria em Brasília.

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O caminho, se adotado, criaria uma crise diplomática inédita. Mas não é descartada como cenário por interlocutores da Justiça, adidos da PF no exterior e da diplomacia consultados pelo UOL. O tema é "acompanhado de perto", segundo fontes na capital federal.

Experientes embaixadores estimam que, para tomar uma decisão de dar asilo, um país estrangeiro terá de pesar o impacto que isso terá para a relação bilateral. "O custo político pode ser altíssimo", indicou um deles. A reação do Itamaraty seria a de denunciar um envolvimento na política doméstica e mesmo retirar da capital respectiva seu próprio embaixador, como sinal de protesto.

Portanto, não seria uma decisão simples a de resgatar Bolsonaro.

Extrema direita: Desafiando a Justiça

No caso da Hungria, o país europeu que serve de epicentro da extrema direita, já deu demonstrações nesta semana que está disposta a ajudar seus aliados ultraconservadores a desafiar a Justiça. Viktor Orban anunciou que vai convidar Benjamin Netanyahu para uma visita oficial ao seu país, desafiando o mandado de prisão emitido pelo Tribunal Penal Internacional por crimes de guerra e crimes contra a humanidade.

Um gesto explícito de ataque às instituições.

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A embaixada de Israel poderia ser outra opção para Bolsonaro? Haia, de fato, já uniu Bolsonaro e Netanyahu. Durante a pandemia, o israelense sugeriu aos representantes do ex-presidente que se preparassem para uma denúncia em Haia, durante a crise da covid-19.

Naquele momento, os dois governos emitiram um comunicado no qual o Bolsonaro dava seu respaldo ao israelense contra o TPI, antes mesmo de Gaza ocorrer.

E Javier Milei e sua vontade de criar problemas para o vizinho brasileiro?

Tudo vai depender, porém, dos cálculos da extrema direita mundial sobre os benefícios que poderia ter caso "resgatassem" Bolsonaro.

Ainda que estivesse em uma embaixada estrangeira, o ex-presidente indiciado por golpe de Estado teria dificuldades em chegar a um aeroporto. Salvo no caso de um improvável acordo e salvo conduto.

Enquanto isso, a campanha descaradamente mentirosa de apresentar o Brasil como uma "ditadura de esquerda" ganha novos capítulos no exterior. Nas últimas semanas, parlamentares bolsonaristas têm viajado aos EUA com dinheiro público para tentar conquistar o apoio de membros da Comissão Interamericana de Direitos Humanos. A meta é a de convencer o órgão a agir contra o Brasil por conta de uma suposta operação para silencia-los.

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A estratégia conta com o apoio de uma entidade ultraconservadora, a ADF, e que foi designada nos EUA como uma entidade radical. Os parlamentares ainda conseguiram que deputados aliados a Trump escrevessem uma carta ameaçando a Comissão com o corte de recursos, caso não atuem contra o Brasil.

A realidade é que a extrema direita mundial é organizada, tem recursos, plano e um objetivo claro. Quando opta por agir, as consequências são reais.

Ousadia já sabemos que eles têm. De fato, para alguns deles, o comportamento do ex-presidente não foi suficientemente ousada. Numa conversa que consta de um dos documentos da PF que embasou a prisão dos militares golpistas nesta semana, o suspeito critica a decisão de Bolsonaro de convocar uma reunião para tratar do tema e que, segundo ele, tinha gente demais.

Em 4 de novembro de 2022, o militar defendia a necessidade de um encontro apenas com "petit comitê", sem a presença de ministros, AGU ou TCU.

"Tem que ser a Rataria. Ele (Bolsonaro) e a Rataria", sentenciou o militar preso.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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