Brasil elogia Biden por gesto sobre Cuba e pede que Trump mantenha decisão

O governo brasileiro elogiou a decisão do presidente dos EUA, Joe Biden, que anunciou a retirada de Cuba da lista de países que patrocinam o terrorismo. A medida deve suavizar as sanções contra a ilha, que vive sua pior crise em décadas. Numa nota, o Brasil ainda sugere que a decisão seja mantida pelo governo de Donald Trump, que assume na próxima semana.
"O governo brasileiro recebeu, com grande satisfação, a decisão do governo dos Estados Unidos de revogar sua designação unilateral de Cuba como Estado patrocinador do terrorismo, suspender a aplicação do Título III da Lei Helms-Burton e eliminar restrições para o relacionamento entre indivíduos e entidades norte-americanos com congêneres cubanos", disse.
De acordo com a nota, o Brasil "sempre sublinhou, tanto em suas manifestações públicas nos foros multilaterais e regionais quanto em seu diálogo com o governo norte-americano, ser injusta e injustificada a manutenção de Cuba em uma lista unilateral de países que promovem o terrorismo, quando é de amplo conhecimento que Cuba colabora ativamente para a promoção da paz, do diálogo e da integração regional".
O UOL apurou que, desde o primeiro encontro entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Biden, no início de 2023, o brasileiro insistiu sobre o fim das sanções.
"Muito embora parciais e limitadas, as medidas de alívio adotadas pelos Estados Unidos vão no sentido correto e constituem ato de reparação e de restabelecimento da justiça e do direito internacional", afirmou o governo brasileiro.
Na nota, o governo brasileiro ainda faz uma sinalização à próxima administração.
"O governo brasileiro faz votos de que essas medidas possam apontar o caminho para um padrão de relacionamento construtivo entre Cuba e Estados Unidos, baseado no diálogo, na cooperação e no respeito às normas internacionais", indicou.
O que aconteceu
Às vésperas de deixar o poder, o presidente Joe Biden informa ao Congresso americano que irá retira Cuba da lista de países que patrocinam o terrorismo. A medida faz parte de um gesto para garantir que Havana liberte prisioneiros políticos, e abre espaço para investimentos e um maior comércio com a ilha, que vive sua pior crise econômica em décadas.
A Casa Branca indicou que o gesto ainda ocorre depois de pedidos feitos por países como Brasil, Chile, Espanha, Colômbia e pela União Europeia, assim como pela Santa Sé. Caberá ao Vaticano dialogar pela soltura dos prisioneiros.
Segundo a entidade Anistia Internacional, existiriam cerca de 670 presos em Cuba a partir dos protestos de julho de 2021. Pelo acordo, essas pessoas seriam liberadas antes do final do governo Biden, no dia 20 de janeiro.
Além de retirar da lista de países que patrocinam o terrorismo, Biden também está encerrando sanções criadas por Trump e que restringiam transações financeiras com entidades cubanas.
De acordo com a Casa Branca, duas condições foram atendidas para que a medida pudesse ser anunciada:
- O governo de Cuba não forneceu nenhum apoio ao terrorismo internacional durante o período de 6 meses anterior; e
- O governo de Cuba deu garantias de que não apoiará atos de terrorismo internacional no futuro.
Cuba passou a fazer parte da lista dos países que patrocinam o terrorismo em 1982, diante das acusações de que Fidel Castro estaria acolhendo membros das Farc. Em 2015, Barack Obama retirou o país da lista.
O risco, porém, é de que essa decisão não tenha uma longa vigência. Na próxima segunda-feira, Biden será sucedido por Donald Trump que, em sua equipe, já designou nomes da ala anticastrista para liderar alguns dos departamentos mais importantes de sua política externa. Um deles, Marco Rubio, é filho de imigrantes cubanos e será o chefe da diplomacia do republicano.
Foi justamente Rubio, como senador, que apresentou uma proposta de lei em 2023 que impediria Cuba de ser retirada da lista de países patrocinadores do terrorismo.
O senador republicano Ted Cruz, do Texas, já anunciou que vai trabalhar para reverter a medida. "A decisão de hoje é inaceitável por seus méritos. O terrorismo promovido pelo regime cubano não cessou", disse.
Medida ajudaria Brasil
A comemoração do Brasil não ocorre por acaso. Se confirmada no governo Trump, a medida teria um impacto positivo para o país. No ano passado, o governo cubano iniciou uma negociação para começar a lidar com a dívida que tem com o Brasil. Mas, vivendo sua pior crise econômica em 30 anos, as autoridades cubanas alertaram que o processo para quitar os pagamentos não será simples.
No início de fevereiro de 2024, uma equipe cubana viajou ao Brasil e, numa reunião com o Ministério da Fazenda, sinalizou oficialmente que reconhece a existência das dívidas. Para diplomatas brasileiros, o encontro foi importante, por apontar que as autoridades de Havana estão dispostas a sentar para conversar. Outras fontes em Brasília ainda consideram que se tratou de um "passo relevante, ainda que o diálogo esteja apenas no seu começo".
Do lado brasileiro, o posicionamento foi de que o governo entende as dificuldades, mas que soluções precisam começar a ser buscadas e que um encaminhamento precisa ser feito.
Reconhecida a dívida, o primeiro passo da negociação será sobre o tamanho exato do valor a ser pago. O Brasil aponta que o valor seria de R$ 671,7 milhões. Um dos aspectos centrais se refere ao empréstimo feito pelo BNDES para as obras do porto de Mariel, nas proximidades de Havana.
Mas os cubanos também sinalizaram que terão dificuldades para iniciar os pagamentos.
O distanciamento promovido pelos governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro tampouco ajudou. De uma balança comercial de mais de US$ 670 milhões em 2013, ela hoje não passa de US$ 150 milhões.
O governo brasileiro admite que, diante da crise cubana, é difícil imaginar que haverá um fluxo financeiro constante para arcar com a dívida. A ideia em Brasília é a de dar espaço para que modelos "criativos" sejam encontrados para sair do default.
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