'Humilhação': a palavra que mais escutei na fronteira entre México e EUA

Piedras Negras é um dos epicentros do fluxo de imigrantes que tentam chegar aos EUA. Entre a cidade mexicana e o território americano, há apenas o Rio Grande. Mas cruzar é, hoje, uma tarefa praticamente impossível. Do lado dos EUA, soldados e arames farpados protegem o país da "invasão".
Mas, do lado mexicano, a prefeitura da cidade construiu uma espécie de varanda às margens do rio. Ali, bancos foram colocados, com vista aos EUA. O sonho está ali, tão próximo. Mas tão distante.
Quem para para descansar por alguns minutos nestes bancos descobre também o que existe atrás dos arames farpados e do muro erguido pelos EUA. E a visão parece fazer parte de uma distopia. Ou de uma provocação.
O que se vê é um campo de golfe em pleno deserto, com pouca grama. E cidadãos americanos que, sem constrangimento, fazem suas tacadas de buraco em buraco. O público que os assiste está do outro lado da fronteira.
"Isso é uma espécie de humilhação", diz um hondurenho, que teve sua entrada rejeitada nos EUA. "Com tanta terra, precisam jogar golfe na nossa cara?"
Das varandas dos sonhos perdidos, há ainda outra visão: a das bandeiras americanas fincadas com orgulho e em uma altura suficiente para que o outro lado possa vê-las. São os sinais dos restaurantes de um McDonald's e de um Burger King do lado de lá da fronteira.
Ao longo dos últimos dias, caminhando por mais de 300 quilômetros na fronteira entre o Texas e o território mexicano, a palavra "humilhação" foi a que mais ouvi. Todos admitem que a segurança das fronteiras é um dever dos governos. Mas é o processo de desumanização do outro que quebra muitos dos estrangeiros.
São humilhados pelos seus governos, que os abandona. Humilhados por cartéis pelo caminho que os exploram. E humilhados na fronteira ao serem tratados como criminosos.
Do lado norte do Rio Grande está uma sociedade com o direito à memória coletiva e um destino manifesto. Na margem sul, uma humilhação coletiva com direito a estupros à dignidade.
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