'Insano', 'racista' e 'criminoso': mundo reage ao plano de Trump para Gaza
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A proposta de Donald Trump de tomar Gaza e expulsar os palestinos que vivem na região foi alvo de condenações tanto por parte de aliados como de inimigos dos EUA.
A iniciativa foi qualificada na ONU como uma "bomba nuclear" no cenário internacional, levando a cúpula da ONU e alguns dos principais diplomatas do mundo a passar a madrugada ao telefone para coordenar posições. Trump chegou a falar em criar, na região, uma "Riviera do Oriente Médio".
Na noite de terça-feira, Trump chocou o mundo ao anunciar seu plano, ao lado do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu.
Trump disse que a ocupação americana poderia ser a longo prazo. "Eu vejo uma posição de propriedade de longo prazo", disse. "Todos com quem conversei adoram a ideia de os Estados Unidos possuírem aquele pedaço de terra", completou.
O presidente dos EUA ainda disse que outros países poderiam receber os palestinos que estão na Faixa de Gaza. "Ela tem sido símbolo de morte e destruição por décadas, tão ruim para a população que vive ali. Muita falta de sorte naquele lugar. Não deveria ocorrer um processo de reconstrução pelas mesmas pessoas que estão lá. Em vez disso, deveriam ir para outros países com interesse em questões humanitárias", afirmou.
Ao deixar Washington, Netanyahu ganhou um quadro com uma foto sua e de Trump. Nela, o americano escreveu: "Para Bibi, um grande líder".
França
O governo de Emmanuel Macron, que tentou se aproximar de Trump, rejeitou a ideia e alertou que sua proposta violaria o direito internacional e desestabilizaria a região.
"A França reitera sua oposição a qualquer deslocamento forçado da população palestina de Gaza, o que constituiria uma grave violação do direito internacional, um ataque às legítimas aspirações dos palestinos, mas também um grande obstáculo à solução de dois Estados e um grande fator de desestabilização para nossos parceiros próximos, Egito e Jordânia, bem como para toda a região", disse o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Christophe Lemoine, em um comunicado.
Lemoine ainda destacou que o futuro de Gaza deve estar no contexto de um futuro Estado palestino e não deve ser controlado por um terceiro país.
Reino Unido
Outro tradicional aliado americano, o Reino Unido, se negou a ver o plano como base de uma discussão. "Precisamos ver os palestinos capazes de viver e prosperar em suas terras natais em Gaza e na Cisjordânia. É a isso que queremos chegar", disse David Lammy, chefe da diplomacia britânica, em uma coletiva de imprensa em Kiev, capital da Ucrânia.
China: contra 'transferência forçada'
Nesta quarta-feira, a China alertou que irá se opor à "transferência forçada" de palestinos da Faixa de Gaza. "A China sempre defendeu que o governo palestino sobre os palestinos é o princípio básico da governança de Gaza no pós-guerra, e nos opomos à transferência forçada dos residentes de Gaza", disse o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Lin Jian.
Arábia Saudita: 'rejeição inequívoca'
O governo da Arábia Saudita, por exemplo, alertou que não normalizaria os laços com Israel sem a criação de um Estado palestino.
O Ministério das Relações Exteriores de Riad, aliado tradicional dos EUA, disse que rejeitava qualquer tentativa de deslocar os palestinos de suas terras. Isso, segundo eles, seria inegociável.
"A Arábia Saudita também reitera sua rejeição inequívoca, anunciada anteriormente, de qualquer violação dos direitos legítimos do povo palestino, seja por meio de políticas de assentamento israelenses, da anexação de terras palestinas ou de tentativas de deslocar o povo palestino de suas terras", afirmou a chancelaria, num comunicado.
Turquia: 'inaceitável'
O governo da Turquia, parte da Otan, também criticou a proposta de Trump.
"Essa é uma questão inaceitável", disse o ministro das Relações Exteriores da Turquia, Hakan Fidan. "Isso é algo que nem nós nem a região podemos aceitar". "É errado sequer trazer isso à tona para discussão", acrescentou.
Alemanha: proposta levaria a um 'novo ódio'
A Alemanha também rejeitou o plano.
"A população civil de Gaza não deve ser expulsa e Gaza não deve ser permanentemente ocupada ou repovoada", disse Annalena Baerbock, a chefe da diplomacia alemã em um comunicado. "Está claro que Gaza - assim como a Cisjordânia e Jerusalém Oriental - pertence aos palestinos. Elas formam a base para um futuro Estado palestino."
"Isso também levaria a um novo sofrimento e a um novo ódio. Não deve haver nenhuma solução que passe por cima da cabeça dos palestinos", completou.
Egito
O ministro das Relações Exteriores do Egito, Badr Abdelatty, defendeu uma rápida reconstrução de Gaza. Mas sem o deslocamento dos palestinos do território. Em conversas com o primeiro-ministro palestino, Mohammed Mustafa, no Cairo, os dois concordaram com "a importância de avançar com os projetos de recuperação antecipada... em um ritmo acelerado... sem que os palestinos deixem a Faixa de Gaza, especialmente com seu compromisso com sua terra e recusa em deixá-la".
Autoridade Palestina: 'direitos inegociáveis'
Num comunicado, o presidente palestino, Mahmoud Abbas, "rejeitou veementemente" o plano de Trump.
"O presidente Mahmoud Abbas e a liderança palestina expressaram sua forte rejeição aos apelos para tomar a Faixa de Gaza e deslocar os palestinos para fora de sua terra natal", disse o escritório de Abbas em um comunicado, acrescentando que 'os direitos palestinos legítimos não são negociáveis'.
O secretário-geral da OLP, Hussein al-Sheikh, também rejeitou os pedidos de deslocamento do povo palestino de sua terra. "A liderança palestina afirma sua posição firme de que a solução de dois Estados, de acordo com a legitimidade internacional e o direito internacional, é a garantia de segurança, estabilidade e paz", disse.
Já o embaixador da Palestina na ONU, Ryiad Mansour, insistiu que Gaza é "nossa terra". "E não sairemos de la", disse. "O povo palestino precisa ser respeitado", afirmou. "Nosso país é onde nossa casa está. Não temos casa hoje", lamentou.
Hamas: 'racistas'
A condenação também veio do Hamas. Sami Abu Zuhri, um de seus líderes, afirmou que a proposta era "racista".
"Os comentários de Trump sobre seu desejo de controlar Gaza são ridículos e absurdos, e quaisquer ideias desse tipo são capazes de incendiar a região", disse Abu Zuhri. "Nós os consideramos [o plano] uma receita para gerar caos e tensão na região porque o povo de Gaza não permitirá que tais planos sejam aprovados."
Jordânia
Um dos maiores aliados dos EUA no Oriente Médio, a Jordânia, assinou uma declaração conjunta no início da semana se recusando a aceitar a proposta. O rei Abdullah visitará Washington na próxima semana e o tema estará no centro de discussões. Seu país está sendo pressionado por Trump a receber parte dos palestinos de Gaza.
Rússia
O governo de Vladimir Putin foi outro que rejeitou a iniciativa. "Há planos israelenses para assumir o controle total da Cisjordânia ocupada e tentativas de deslocar os palestinos da Faixa de Gaza", disse o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov.
A Rússia acredita que um acordo no Oriente Médio só é possível com base em uma solução de dois Estados, disse o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov.
Reações nos EUA:
A entidade Anistia Internacional atacou a proposta. Seu diretor, Paul O'Brien, alertou que retirar todos os palestinos de Gaza era "equivalente a destruí-los como povo". "Gaza é o lar deles. A morte e a destruição de Gaza são resultado do governo de Israel que mata civis aos milhares, muitas vezes com bombas americanas", disse.
Já Abed Ayoub, diretor executivo do Comitê Antidiscriminação Americano-Árabe (ADC), disse que a proposta de Trump é "aterrorizante" e "insana".
Nancy Okail, presidente do Center for International Policy, disse que a proposta de Trump ecoa ideias dos "capítulos mais sombrios da história". "Os comentários do presidente Trump propondo que a população da Faixa de Gaza seja permanentemente realocada e que os Estados Unidos 'assumam' o território são nada menos que um chamado aberto para a prática de um crime contra a humanidade", disse Okail.
"É inconcebível que um presidente dos Estados Unidos promova o deslocamento forçado de uma população e a aquisição de um território no século 21", disse.
O Conselho de Relações Americano-Islâmicas alertou sobre as consequências do plano.
"Se o povo palestino fosse de alguma forma expulso à força de Gaza, esse crime contra a humanidade completaria o genocídio israelense dos palestinos", disse.
O Instituto Árabe-Americano disse que Trump recebeu um "criminoso de guerra" na Casa Branca para uma "discussão casual" sobre genocídio e limpeza étnica. "A proposta desafia décadas de apoio bipartidário americano a uma solução de dois Estados - o único meio viável de garantir a paz, a estabilidade e a segurança para os povos israelense e palestino", disse o grupo.
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