Trump confirma taxa ao aço e afeta US$ 6 bi em exportações do Brasil
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Em uma guinada protecionista inédita no setor siderúrgico, o presidente norte-americano, Donald Trump, suspendeu todos os acordos, cotas e isenções com aliados e impôs uma sobretaxa de 25% sobre o aço e alumínio de todos os países. As medidas ainda ampliam os controles aduaneiros e fecham a possibilidade de russos e chineses driblarem barreiras.
A decisão —que é ainda maior do que havia sido anunciado no domingo — afeta diretamente mais de US$ 6 bilhões em exportações brasileiras. A medida deve ser respondida pelo governo brasileiro, que avalia como retaliar os Estados Unidos, sem que isso cause prejuízo para a própria indústria nacional ou que represente uma escalada numa guerra comercial.
Questionado o que ocorreria se alguém optasse por retaliar, Trump dobrou a ameaça. "Eu não me importo", disse. "Na verdade, esses países não podem realmente retaliar", afirmou.
Nesta segunda-feira, o presidente americano assinou uma ordem executiva que estabelece sua política protecionista, independente da origem que o aço tenha e com taxas iguais para todos os fornecedores.
O maior afetado será o Canadá, seguido pelo Brasil, o segundo maior fornecedor de aço aos americanos. Grandes exportadores como Coreia do Sul, UE e México também serão especialmente afetados.
Hoje, um quarto do consumo de aço no mercado americano é abastecido por fornecedores estrangeiros.
A ação é mais ambiciosa que as medidas protecionistas adotadas em seu primeiro governo. Entre os atos anunciados está a orientação para que as aduanas americanas ampliem o monitoramento para evitar que países reclassifiquem o aço exportado e, assim, consigam driblar as tarifas.
Ordem cita Brasil e outros países como plataforma para China
As medidas também têm como objetivo evitar que Rússia e China possam exportar produtos siderúrgicos para o Canadá e México e, de lá, permitir que os produtos entrem no mercado americano. Para isso, a Casa Branca determinou padrões de qualidade para permitir a entrada dos produtos, moldando os critérios para impedir que itens russos e chineses possam ser aceitos.
Num dos trechos da ordem executiva, Trump cita textualmente o Brasil como um exemplo para indicar que haveria uma manipulação do comércio para permitir que o aço chinês chegue aos EUA.
"As importações brasileiras de países com níveis significativos de excesso de capacidade, especificamente a China, cresceram enormemente nos últimos anos, mais do que triplicando desde a instituição desse acordo de cotas", disse.
O caso brasileiro, porém, não é o único e a Casa Branca não poupou nem mesmo a Argentina de seu aliado Javier Milei.
Com o decreto, Trump aumenta as tarifas de alumínio de 10% para 25% e acaba com todas as isenções, exclusões e acordos de cotas que os EUA tenham com qualquer país do mundo.
Horas antes de assinar a ordem executiva, o presidente manteve uma conversa com o primeiro-ministro da Austrália, Anthony Albanese, que solicitou que os produtos do país da Oceania fossem poupados. Trump, porém, se recusou a atender ao aliado.
Fontes da Casa Branca indicaram que, com a medida, o governo Trump quer "restaurar a força das indústrias americanas do aço e de alumínio e colocar um fim à exploração que mina os trabalhadores americanos".
"Faremos os EUA ricos de novo", disse Trump. Segundo ele, os EUA estavam sendo "enganados" por inimigos e aliados. "Precisamos proteger o setor e isso vai valer para todos os países", disse. De acordo com ele, a produção precisa "voltar aos EUA".
Trump, porém, deixou claro que vai continuar negociando com mexicanos e canadenses, principalmente sobre carros e produtos farmacêuticos.
"As tarifas de aço e alumínio 2.0 acabarão com o dumping estrangeiro, estimularão a produção doméstica e garantirão nossas indústrias de aço e alumínio como espinha dorsal e pilar da segurança econômica e nacional dos Estados Unidos", disse Peter Navarro, assessor comercial da Casa Branca. "Não se trata apenas de comércio. Trata-se de garantir que os Estados Unidos nunca mais precisem depender de nações estrangeiras para setores essenciais como o aço e o alumínio", explicou.
Retaliação
De uma maneira coordenada, vários dos países atingidos preparam suas respostas. A Comissão Europeia anunciou que iria reagir para proteger os interesses do bloco, enquanto o chanceler alemão Olaf Scholz qualificou a atitude de "ilegal". O governo da Coreia do Sul ainda realizou uma reunião de emergência com as siderúrgicas para discutir medidas que minimizem o impacto das possíveis tarifas.
Desde a vitória de Trump, a esperança do Brasil era não ser notado pelo presidente americano. A orientação no governo Lula era de que, por mais que houvesse uma diferença de posições em relação a quase todos os temas globais, uma crise não viria do Brasil.
Mas o inevitável acabou se confirmando, com a imposição de tarifas sobre um setor estratégico do país.
Os levantamentos confirmam que o setor afetado é fundamental na relação bilateral. "Os Estados Unidos são destino importante das exportações brasileiras dos setores de ferro e aço e alumínio. Em 2024, o Brasil vendeu US$ 11,4 bilhões no setor de ferro e aço para o mundo, sendo que 48,0% (US$ 5,7 bilhões) foram direcionadas para os Estados Unidos, e US$ 1,6 bilhão no setor de alumínio, sendo 16,8% (US$ 267,1 milhões) aos Estados Unidos", disse um recente informe da Câmara de Comércio Brasil EUA.
"Investigações sobre ameaça à segurança nacional relacionadas às importações foram levadas a cabo no primeiro mandato do governo Trump para determinados produtos de aço e alumínio e resultaram em uma sobretaxa de 10% para alumínio e quota com limitação de exportação para o aço", lembrou o documento. "O Brasil, um dos maiores fornecedores aos Estados Unidos, foi afetado principalmente em bens semimanufaturados de aço", constatou.
Produtos semi-acabados de ferro ou aço ocupam o segundo lugar entre os itens mais exportados do Brasil para os EUA. Em 2024, o volume chegou a US$ 3,5 bilhões.
Brasil sinaliza que dará resposta
Dentro do governo brasileiro, a ordem é a de usar o "pragmatismo e serenidade" para dar uma resposta. O Itamaraty não quer escalar a crise. Mas tampouco ficará em silêncio.
Conforme o UOL revelou no sábado, uma lista de produtos e setores começou a ser desenhada para uma eventual retaliação. Um dos segmentos poderia ser as empresas digitais.
Durante seu primeiro mandato, Trump impôs tarifas de 25% sobre o aço e 10% sobre o alumínio. Ao longo dos anos, acabou negociando cotas para Canadá, México e Brasil. Mas, ao final de seu governo, Trump instalou barreiras aos produtos siderúrgicos do Brasil, na esperança de ganhar o voto de estados estratégicos. O governo de Jair Bolsonaro, na época, aceitou a taxa como uma forma de ajudar seu aliado a ser reeleito, o que não aconteceu.
As tarifas promoveram uma alta nas ações de empresas siderúrgicas americanas. A Nucor abriu com um incremento de 9,5% e a Century Aluminum registrou uma alta de 8,5%. Já as ações da europeia ArcelorMittal e Hyundai Steel caíram.
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