Trump e Lula disputam Comissão Interamericana em eleição estratégica

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Donald Trump e Lula vão disputar espaço na Comissão Internacional de Direitos Humanos. Em um esforço para ocupar o órgão regional, a Casa Branca anunciou a candidatura da filha de um dissidente cubano para uma das três vagas na Comissão. Brasil também decidiu lançar um candidato. A corrida ainda conta com outros cinco nomes.
A iniciativa de Washington faz parte da estratégia para influenciar a agenda internacional de direitos humanos e instrumentalizar as agências para cumprirem os objetivos de política externa da Casa Branca.
O Brasil também articula com outros governos da região uma contraofensiva para não deixar a Comissão cair nas mãos da Casa Branca ou de movimentos de extrema direita. A eleição ocorre no final de julho.
O nome escolhido pela Casa Branca para o processo eleitoral é Rosa María Payá. Em comunicado, o Departamento de Estado norte-americano explicou que ela é "uma defensora da democracia respeitada internacionalmente, líder em direitos humanos e especialista em política latino-americana, conhecida por seus esforços para promover a liberdade, os direitos humanos e a governança democrática em todo o Hemisfério Ocidental".
A candidata atua como diretora-executiva da Foundation for Pan-American Democracy. "Como fundadora da Cuba Decide, ela lidera o mais proeminente movimento pró-democracia, unindo a sociedade civil cubana, ativistas e grupos de oposição para exigir mudanças políticas por meio de um plebiscito obrigatório", diz o governo americano.
A candidata é filha do falecido Oswaldo Payá, opositor cubano. Segundo a Casa Branca, ele foi "assassinado pelo regime cubano".
Em 2023, ela rebateu uma fala do presidente Lula que, ao receber Nicolás Maduro, indicou que as acusações de repressão seriam "uma narrativa".
"As violações dos direitos humanos na Nicarágua, Cuba e Venezuela são reais e não uma narrativa", disse Payá, em pronunciamento durante o 53º Período Ordinário de Sessões da Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), em Washington. "É hora dos Estados se unirem contra os ditadores", disse.
Num comunicado que lança sua candidatura, a cubana indicou que seu trabalho inclui a denúncia aos regimes de Cuba e Venezuela. Mas, na busca por votos, sinalizou uma abertura.
"Quero garantir que todos os Estados membros da OEA, independentemente de sua cor política ou tamanho, possam se envolver com a Comissão de maneira respeitosa, eficaz e transparente", disse. "A legitimidade e a força da CIDH dependem de sua imparcialidade, de sua acessibilidade e de sua relevância para todos os povos das Américas", insistiu.
"Meu pai, Oswaldo Payá, deu sua vida pela liberdade e pela democracia, com a convicção de que os direitos vão além das fronteiras da política, da raça ou da cultura", destacou.
Brasil lança candidato
A ofensiva americana fez o Brasil também entrar na corrida. Conforme o UOL revelou há duas semanas, Lula sinalizou que quer um brasileiro na Comissão Interamericana de Direitos Humanos. A aposta do Brasil é pelo acadêmico Fabio de Sá e Silva, que já esteve à frente de pesquisas e políticas em temas prisionais, de segurança pública e acesso à justiça. Silva já trabalhou no antigo Ministério da Justiça e foi consultor de vários organismos internacionais com atuação em direitos humanos, incluindo a própria Comissão.
A eleição no organismo da OEA (Organização dos Estados Americanos) é considerada como estratégica, tanto para os governos progressistas como para o movimento ultraconservador. O voto ocorre no meio do ano e vai definir três das sete vagas da Comissão.
Ao longo da história, o órgão foi fundamental para denunciar ditaduras na América Latina e alertar sobre graves violações de direitos humanos.
Mas, recentemente, passou a ser alvo de uma tentativa por parte da extrema direita para tentar influenciar sua agenda. Grupos como a ADF, com um poderoso escritório de lobby em Washington, passaram a prestar consultoria para as alas mais radicais do bolsonarismo, na esperança de convencer a Comissão de que existe uma suposta ditadura no Brasil e a censura de vozes dissidentes.
Em recentes viagens de deputados do PL para Washington, foram essas entidades que serviram como base logística e chegaram a entrar nas reuniões.
Outro caminho usado pela extrema direita tem sido o da chantagem. Com os americanos bancando uma parcela significativa do orçamento do organismo, deputados da base de Donald Trump ameaçaram cortar os recursos da Comissão, caso o órgão não denunciasse as supostas violações cometidas pelo STF no Brasil.
Um relatório que está sendo preparado por Pedro Vaca, o comissário de Direito de Liberdade de Expressão, promete ser um termômetro importante da capacidade de influência do movimento ultraconservador.
Além da candidata promovida pela Casa Branca, o movimento conservador terá o candidato colombiano Carlos Bernal. Ele, porém, não tem o apoio do governo de Gustavo Petro e foi lançado pelo Peru.
Também estão na corrida a colombiana Maria Clara Galvis, o mexicano José Luis Caballero, a hondurenha Reina Rivera e Marion Bethel, de Bahamas.
Precedente vitorioso
Apesar da preocupação, membros do governo brasileiro destacam que a região já demonstrou que pode se unir quando se sentir ameaçada. Um exemplo foi a candidatura vitoriosa do chanceler do Suriname para ocupar a secretaria-geral da OEA, há poucas semanas.
Numa costura feita por Brasil, Chile, Uruguai e Colômbia, o grupo conseguiu desbancar um candidato paraguaio e que havia recebido a benção de Trump e do bilionário Elon Musk.
A esperança é de que uma combinação semelhante ocorra para não permitir que a Comissão seja ocupada pela extrema direita.
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