Jamil Chade

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Expulsos por Trump, haitianos agora tentam voltar ao Brasil

Imigrantes haitianos que tinham passado pelo Brasil antes de seguir caminho aos EUA agora tentam retornar ao país. Mas enfrentam burocracia e a incapacidade de apresentar os documentos solicitados pelo governo brasileiro para conseguir os vistos.

Em fevereiro, o governo Trump anunciou que estava colocando fim a um visto que permitia que os haitianos pudessem permanecer no país. A autorização havia sido criada em 2010, como uma maneira de ajudar o país que havia sido abalado por crises políticas e humanitárias. Um ano depois, 57 mil haitianos estavam nos EUA, usando o visto criado pelo governo. Em 2024, esse número chegou a 520 mil.

Alguns deles contam que, para chegar aos EUA, usaram o território brasileiro como uma das etapas da viagem e, agora, tentam uma nova chance no Brasil. As famílias, porém, pediram anonimato à reportagem, diante da sensibilidade de seus casos.

Nos últimos anos, eles passaram a usar os vistos humanitários concedidos pelo governo brasileiro para deixar o Haiti e chegar ao país. Após alguns anos em cidades como São Paulo, iniciaram um longo trajeto pela América Latina, até chegar à fronteira entre o México e os EUA. Agora, aqueles que conseguiram entrar estão sendo deportados. Mesmo com um visto.

Lídia Souza, diretora da entidade NECC New England Community Center, relevou ao UOL que vive essa situação na região de Boston. Sua entidade está tentando ajudar famílias haitianas a solicitar o visto brasileiro. Juntas, elas têm 30 filhos nascidos no Brasil. Mas muitos jamais tiraram passaportes nacionais, antes de iniciar o périplo até os EUA. Hoje, estão num limbo.

Lídia relata que uma das famílias tem data marcada para ser deportada ao Haiti e a esperança era a de conseguir viajar, antes, ao Brasil. Mas os vistos ao país foram negados.

Na lista de exigência, o governo brasileiro pede que os imigrantes apresentem prova de residência, prova de "capacidade financeira" e certificado provando que não existem pendências criminais. Para muitos haitianos que moram em abrigos cedidos pelas prefeituras americanas, a solicitação é quase impossível de ser preenchida.

Pelas regras brasileiras, é solicitado ainda que os haitianos mostrem como chegaram ao EUA. Muitos, porém, usaram coyotes nas fronteiras, grupos de contrabandistas que cobram para ajudar os imigrantes a cruzar a fronteira ilegalmente.

Procurado, o Itamaraty indicou que o acolhimento do Brasil aos haitianos é uma política consolidada pelo país.

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Ao longo de sua campanha eleitoral, Trump ainda usou o caso dos haitianos como exemplo para justificar sua promessa de deportação em massa e chegou a indicar que eles estariam comendo animais de estimação de americanos.

A decisão de revogar os vistos foi alvo de protestos por parte de ativistas. Murad Awawdeh, presidente da New York Immigration Coalition, acusou a revogação de ser um "ataque direto às milhares de famílias que construíram suas vidas aqui, contribuindo para nossas comunidades e economia local".

"Essa decisão imprudente e cruel coloca os haitianos em risco de deportação, forçando-os a retornar a um país que ainda sofre com a turbulência política e econômica", disse.

"Os haitianos de Nova York são nossos vizinhos, professores, assistentes de saúde domiciliar e muito mais. Eles merecem estabilidade, e não a ameaça constante de serem arrancados de suas famílias e de sua comunidade em um piscar de olhos com base em nada além de política", afirmou.

Na esperança de frear a deportação, ações foram apresentadas à Justiça. Numa delas, a juíza Indira Talwani determinou que Trump não poderia desfazer os vistos que tinham sido concedidos por administrações passadas. Mas o temor da comunidade de haitianos é de que essa decisão não irá vingar.

Originalmente, a decisão da Casa Branca dava até o dia 24 de abril para que os imigrantes retornassem ao Haiti.

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O problema é que, hoje, o Haiti vive uma verdadeira guerra entre gangues e a violência tomou conta do país. Para muitas famílias, retomar ao Haiti seria uma ameaça às suas vidas.

Reportagem

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