Bolsonaro e Lula guerreiam em torno do ridículo
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Num instante em que Estados Unidos e Irã operam para evitar que a crise no Oriente Médio evolua para uma guerra aberta, Jair Bolsonaro e Lula decidiram travar no Brasil um conflito prosaico. A dupla guerreia em torno do ridículo.
Em publicação nas redes sociais, Lula disparou contra o alinhamento do governo do capitão à política belicista do atual presidente americano: "...O Bolsonaro não faz a menor questão de não ser um lambe-botas do Trump".
Em transmissão ao vivo Bolsonaro contra-atacou no Facebook. Lembrou a proximidade de Lula com o então presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad. Insinuou que o rival petista apoiou o projeto do Irã de obter a bomba atômica:
"O senhor Luiz Inácio Lula da Silva, enquanto presidente da República, esteve no Irã. E lá defendeu que aquele regime pudesse enriquecer urânio acima de 20%, que seria para fim pacífico".
Bolsonaro deixou-se filmar defronte de um aparelho de TV. Assistia ao pronunciamento em que Donald Trump celebrou como vitória a ausência de cadáveres no ataque do Irã a duas bases militares americanas no Iraque.
Na sequência, esgrimindo exemplar da Constituição, Bolsonaro repetiu a menção a Lula antes de ler um trecho do artigo quarto: "A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: a defesa da paz e no repúdio ao terrorismo".
Deu-se em 2010 o episódio evocado por Bolsonaro. Nele, Lula se autoconverteu em piada ao posar de negociador de um acordo entre Irã e Estados Unidos. Diferentemente do que disse Bolsonaro, serviria para evitar a produção da bomba.
Previa o seguinte: o Irã enviaria para a Turquia 1.200 quilos de seu urânio enriquecido a 3,5%. E receberia de volta 120 quilos de combustível enriquecido a 20% —o suficiente apenas para produzir energia nuclear para fins pacíficos.
O diabo é que Lula foi ignorado por Barack Obama. Inquilino da Casa Branca na época, Obama deu uma banana para o colega brasileiro e impôs sanções econômicas ao Irã. Ele "traiu o bom senso", lamuriou-se Lula nesta quarta-feira.
Ironicamente, Obama lideraria em 2015 um acordo nuclear com o Irã. Que seria rompido por Trump em 2018. O mesmo Trump que, neste alvorecer de 2020, ordenou o ataque aéreo com drone que carbonizou o general iraniano Qassem Soleimani.
O governo Bolsonaro aplaudiu a execução do general do Irã. Fez isso por meio de uma nota que tratou o assassinato como parte do esforço contra o "flagelo do terrorismo".
O capitão antipatizou-se de graça com o regime persa dos aiatolás. Deu as costas para a tradição de neutralidade da diplomacia brasileira. De quebra, ignorou o interesse nacional, pois o Irã compra anualmente mais de US$ 2 bilhões em produtos agrícolas do Brasil.
Trump atribuiu ao apoio de Bolsonaro a mesma relevância que Obama atribuíra ao ímpeto negociador de Lula: Nenhuma.
No contexto conflagrado do Oriente Médio, o capitão e a divindade petista têm a aparência de um par de asteriscos. Ao transformar sua desimportância em munição, a dupla escancara a tragédia de um país em que os dois polos que dominam a política perderam a dimensão do ridículo.
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