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Josias de Souza

Bolsonaro e STF impedem otimismo sobre corrupção

Getty Images
Imagem: Getty Images

Colunista do UOL

23/01/2020 12h08

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O Brasil caiu uma posição no ranking mundial de percepção da corrupção de 2019. Passou a ocupar o 106ª posto numa lista de 180 países. Jair Bolsonaro e o Supremo Tribunal Federal são correponsáveis pelo vexame. O presidente da República e a Suprema Corte envenenaram o ânimo do brasileiro, desautorizando o otimismo no quesito combate à corrupção.

A visão coletiva sobre a roubalheira se alimenta de um paradoxo. A explosão de escândalos estimula a impressão de que o país afunda em insanáveis vícios. Isso aconteceu quando a Lava Jato ganhou as manchetes, há seis anos. A sensação de fracasso tende a diminuir na proporção direta do avanço na punição dos culpados. O problema é que o retrocesso veio antes que o brasileiro se convencesse de que era hora de apertar o botão do otimismo.

No futuro, quando a história puder se pronunciar sobre 2019 sem paixões e polarizações, anotará que este foi o ano em que o maior esforço anticorrupção já realizado no país começou a definhar. Feneceu não por falta de material, mas por excesso de desfaçatez. Estabeleceu-se uma aliança tácita entre suspeitos, culpados e cúmplices dos três poderes.

Bolsonaro, um presidente que se elegeu enrolado na bandeira da moralidade, cercou-se de meia dúzia de ministros encrencados com a lei. Nomeou um líder no Senado que é cliente de caderneta da Lava Jato. E agiu às escâncaras para proteger o primogênito, investigado por peculato e lavagem de dinheiro num escândalo que envolve um repasse monetário à primeira-dama do país.

No Supremo, produziram-se recuos em série —da anulação de sentenças à abertura de celas, entre elas a de Lula. Entre as inúmeras pauladas desferidas contra o esforço anticorrupção, a mais forte foi a mudança na regra que permitia a prisão de larápios condenados na segunda instância do Judiciário.

Voltou a vigorar o velho sistema viscoso, no qual os condenados recorrem até a morte ou a prescrição dos crimes, o que vier primeiro. Numa das sessões do Supremo, o ministro Gilmar Mendes, que passou a personificar a meia-volta no imaginário popular, traduziu os humores que prevaleceram em Brasília: "Vamos honrar as calças que vestimos!"

Evocando o teor de mensagens trocadas no escurinho do Telegram pelo ex-juiz Sergio Moro, hoje ministro da Justiça de Bolsonaro, e procuradores de Curitiba, Gilmar acrescentou:

"Falam mal de nós, chamam a nós de vagabundos. Queriam interferir na distribuição de um processo. Falam mal do ministro [Edson] Fachin. Passaram de todos os limites -mentindo, agredindo à Corte. E nós: 'Ah, temos que atender a Lava Jato'."

O sucesso da Lava Jato era atribuído a três fatores: 1) A corrupção passou a dar cadeia; 2) O medo da prisão potencializou as delações; 3) As colaborações judiciais impulsionaram as descobertas. O fim da prisão em segunda instância aboliu o risco de cana. O sumiço do medo transformou delatores em tolos. Quem já passou pela cadeia, como Lula, não volta. Quem aguardava na fila, como Michel Temer e Aécio Neves, não entra.

Num ambiente assim, o cenário que parecia redentor desmorona. A ilusão de que o país estaria maduro para dar um salto no combate à corrupção vira fumaça. Rapidinho, renasce o monstro do mesmo.

O brasileiro é como que tomado de assalto (ops!) pela sensação de que a única consequência de um grande escândalo é produzir outro, e outro, e outro... Não há espaço para otimismo em matéria de combate à corrupção.