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Josias de Souza

Maioria já vê código de barras no governo Bolsonaro

Colunista do UOL

30/05/2020 05h32

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De todas as notícias que o Datafolha trouxe para Jair Bolsonaro nos últimos dias, a mais simbólica ganhou as manchetes neste sábado: 67% dos brasileiros reprovam o casamento do capitão com o centrão.

Significa dizer que praticamente sete em cada dez patrícios passaram a enxergar no governo um código de barras presumido, marca registrada do pacto demoníaco que rege as coligações no Brasil.

Bolsonaro ainda faz pose de limpinho. Alega que negocia cargos de escalões inferiores, não ministérios ou estatais. Tolice. No fisiologismo, integridade é como virgindade. Não existe pela metade. Também não dá segunda safra. Perdeu, perdida está.

O presidente comporta-se, de resto, como um gestor idealista que se rende à realidade. Nessa versão, Bolsonaro seria apenas um presidente bem-intencionado forçado a lidar com uma classe política viciada.

Assim, Bolsonaro adotaria os meios dos parceiros apenas para obter suas nobres finalidades. Bobagem. O capitão se rende para evitar que apertem a corda que ele amarrou ao redor do seu próprio pescoço.

Outra alegada diferença entre o toma-lá-dá-cá de Bolsonaro e o escambo dos antecessores seria a "exigência" de que os partidos do centrão façam indicações técnicas. Conversa mole.

Na máquina estatal, não basta ser técnico. É preciso saber a serviço de quem estarão as habilidades técnicas dos apadrinhados. Se Sergio Moro ainda fosse ministro, Bolsonaro poderia chamá-lo para uma conversa.

Moro relataria uma experiência que viveu como juiz da Lava Jato. Deu-se no interrogatório do primeiro depoimento do delator Paulo Roberto Costa. Ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulinho, como Lula o chamava, foi inquirido em outubro de 2014.

Funcionário de carreira da Petrobras, o réu chegou à diretoria por indicação do PP, um dos partidos que agora se achegam aos cofres da gestão Bolsonaro. Antes de dar por encerrado o interrogatório, Moro perguntou se Paulinho gostaria de "dizer alguma coisa".

E o réu: "Queria dizer só uma coisa, Excelência. Eu trabalhei na Petrobras 35 anos. Vinte e sete anos do meu trabalho foram trabalhos técnicos, gerenciais. E eu não tive nenhuma mácula nesses 27 anos. Se houve erro —e houve, não é?— foi a partir da entrada minha na diretoria por envolvimento com grupos políticos, que usam a oração de São Francisco, que é dando que se recebe. Eles dizem muito isso. Então, esse envolvimento político que tem, que tinha em todas as diretorias da Petrobras, é uma mácula dentro da companhia."

Ou seja: em meio a muitas dúvidas sobre o modo como Bolsonaro administra o balcão, só uma coisa é certa: ainda que o centrão retirasse coelhos de suas cartolas, o objetivo do grupo seria transformá-los em gambás.

De acordo com o Datafolha, 64% dos entrevistados disseram que Bolsonaro descumpre o que prometera na campanha de 2018 sobre o modo como se relacionaria com o Legislativo. Esse sentimento coletivo tem um nome na política. Chama-se estelionato eleitoral.