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Josias de Souza

Embate Gilmar X Exército expõe patologia política

Colunista do UOL

15/07/2020 22h39

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Gilmar Mendes atribuiu um conceito genocida à gestão militar do general Eduardo Pazuello no Ministério da Saúde e, por extensão, à Presidência de Jair Bolsonaro. O ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, reagiu protocolando uma representação na Procuradoria-Geral da República. O embate eletrificou o noticiário por quatro dias, até que entrasse em cena a turma do deixa-disso. O general Pazuello viu-se constrangido, por assim dizer, a prestar contas a um ministro do Supremo. Fez isso por ordem do presidente, cujo primogênito, Flávio 'Rachadinha' Bolsonaro, tem um pedido de foro especial que aguarda por uma decisão de Gilmar Mendes na Suprema Corte. Esse enredo revela o nível de abastardamento a que chegou a política brasileira.

O governo cometeu erros em série na Saúde. Em plena pandemia, dois ministros médicos foram expurgados da pasta. Há dois meses, o cargo é exercido interinamente por um general que frequentou a escola de paraquedismo, não de medicina. Até o momento, os dois feitos mais notáveis do general no cargo foram a substituição do staff técnico do ministério por quase três dezenas de militares, além de uma tentativa frustrada de maquiar os dados sobre a evolução dos mortos do coronavírus.

Tudo isso é matéria-prima para a oposição, não para um ministro do Supremo. A oposição é necessária e faz bem à democracia. Mas a oposição brasileira frequenta a conjuntura sem demonstrar nenhuma utilidade. Por ora, a oposição não conseguiu fazer bem nem a si mesma. Dias atrás, aprovou-se no Congresso um projeto para impulsionar o saneamento básico no Brasil. E a oposição votou contra. As forças de oposição ao governo Bolsonaro precisam de uma ideia. Qualquer ideia.

Foi contra esse pano de fundo que um ministro do Supremo achou que seria adequado realçar que não é papel das Forças Armadas substituir o corpo técnico do Ministério da Saúde em meio à maior pandemia da história. Gilmar Mendes esqueceu que, do mesmo modo, não é atribuição de um ministro da Suprema Corte atuar como líder da oposição numa causa sobre a qual ele pode ser chamado a atuar como magistrado. A militarização do governo e a politização do Judiciário são patologias de um país em franca degradação.