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Josias de Souza

Bolsonaro venera 64, mira 22 e ignora o presente

Colunista do UOL

08/09/2020 05h08

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Jair Bolsonaro sofre de uma megalomania às avessas. Tornou-se um caso raro de presidente que cultua a mania de pequena grandeza. A propósito do Dia da Pátria, o capitão exibiu sua pequenez em rede nacional.

Olhando pelo retrovisor, Bolsonaro enalteceu o patriotismo. Incluiu o golpe militar de 1964 entre os feitos dignos de celebração. Ao vislumbrar o para-brisa, absteve-se de informar o que fará para melhorar a pátria.

Bolsonaro mostrou-se confortável ao volante. Mas não expôs nada parecido com um itinerário capaz de levá-lo em triunfo até 2022. Preferiu desperdiçar o tempo da audiência com uma pegadinha dirigida ao Grupo Globo.

Como observou o colunista Mauricio Stycer, o presidente injetou em sua fala nacos de um editorial escrito por Roberto Marinho (1904-2003). Nele, o patriarca da Globo escreveu coisas assim:

"Participamos da Revolução de 1964, identificados com os anseios nacionais de preservação das instituições democráticas, ameaçadas pela radicalização ideológica, greves, desordem social e corrupção generalizada".

Ao repetir as palavras de Marinho sem lhe atribuir a autoria, Bolsonaro como que jogou uma casca de banana no caminho do jornalismo da Globo. Se criticado, gargalharia, forçando a Globo a repetir que já admitiu que o editorial sobre 1964 "foi um erro"..

Esse tipo de molecagem tem potencial para atrair a velha maldição do ensaísta inglês Samuel Johnson (1709-1784): "O patriotismo é o último refúgio do canalha".

Como previsto, a crise sanitária mergulhou a economia brasileira numa recessão. O Tesouro continua no osso. A inépcia ambiental afugenta investidores. Falta verba para o cafezinho. Mas Bolsonaro ignorou o presente. É um traço da mania de pequena grandeza.