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Josias de Souza

Individualismo produziu fratura exposta no STF

Rosinei Coutinho/SCO/STF
Imagem: Rosinei Coutinho/SCO/STF

Colunista do UOL

16/10/2020 19h53

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A sessão de julgamento do caso do narcotraficante André do Rapp deixou exposta uma fratura que há muito tempo deforma o Supremo Tribunal Federal. A decisão de Luiz Fux de cassar o despacho de Marco Aurélio Mello, que havia libertado o bandido, foi referendada por 9 votos a 1. Mas a elasticidade do placar favorável ao restabelecimento da ordem de prisão não impediu que vários ministros manifestassem sua contrariedade com o fato de o presidente da Corte ter cassado a decisão de um de seus pares, sobre o qual ele não tem ascendência hierárquica.

Tomado como uma instituição, o Supremo emite suas decisões no plenário, depois que os 11 ministros votam. Entretanto, algo como 80% das deliberações do tribunal têm sido tomadas individualmente. São as chamadas decisões monocráticas. Certas decisões nem sempre são recebidas pela sociedade como decisões certas. E os ministros ficam incomodados quando posições idiossincráticas de um ou outro colega se confundem com a opinião do próprio Supremo.

Nesse ambiente, só duas coisas podem salvar a harmonia do Supremo: um milagre ou um acordo de procedimentos capaz de fazer com que as decisões individuais sejam submetidas rapidamente ao plenário. Como Deus parece ter terceirizado a Justiça brasileira ao Tinhoso, resta a tentativa de costura de um acordo. Discute-se há quatro meses, desde a Presidência de Dias Toffoli, a ideia de jogar as decisões individuais automaticamente para os 11 ministros, no plenário virtual da Corte.

Com essa novidade, despachos solitários seriam confirmados ou derrubados pelo plenário num intervalo de uma semana. Essa experiência precisa ser testada. Se a reação à abertura da cela de um chefão do PCC serviu para alguma coisa foi para demonstrar que a opinião pública brasileira já não convive pacificamente com um Supremo no qual um único ministro pode dificultar ou arruinar o trabalho de juízes, procuradores e da polícia —seja no combate ao crime organizado ou no enfrentamento da corrupção. Se é para errar, que o Supremo erre coletivamente.