Topo

Josias de Souza

Bolsonaro soou ilógico, contraditório e inconsequente

Colunista do UOL

21/10/2020 19h13

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Jair Bolsonaro soou ilógico, contraditório e inconsequente ao desautorizar o seu ministro da Saúde, Eduardo Pazuello. O presidente descartou a hipótese de o governo adquirir doses da vacina do laboratório chinês Sinovac, testada no Brasil pelo Butantan, sob o argumento de que "o povo brasileiro não será cobaia de ninguém". Escreveu nas redes sociais que a "vacina chinesa do João Doria" precisa ser atestada cientificamente e certificada pela Anvisa "antes de ser disponibilizada à população."

Bolsonaro soou ilógico porque ninguém declarou que o brasileiro será feito de cobaia. Não há na praça nenhum maluco falando em submeter a população a vacinas de eficácia duvidosa. Ao contrário, a Anvisa monitora o desenvolvimento no Brasil de quatro vacinas, entre elas a CoronaVac, testada pelo Butantan. Essas vacinas só obterão certificado da agência oficial se ficar comprovada a eficácia. O presidente soou contraditório porque, afora o dinheiro aplicado na produção de cloroquina, o governo já investe recursos em vacinas ainda em fase de teste: a de Oxford e as do consórcio coordenado pela OMS.

Bolsonaro soou inconsequente porque desautorizou algo que havia autorizado previamente. Pazuello é um general. Não se move sem combinar os movimentos com o comandante. Fez isso porque foi fustigado por devotos radicais nas redes sociais. A notícia sobre o protocolo da Saúde com o Butantan frequentava todas as manchetes na noite de terça-feira. O presidente foi dormir em paz. Na manhã desta quarta-feira, em visita ao seu habitat natural da internet, Bolsonaro tornou-se belicoso. Humilhou seu ministro da Saúde porque ficou com a impressão de que o general Pazuello estendeu um tapete vermelho para o rival João Doria desfilar suas pretensões políticas.

A manifestação do presidente é um desperdício de mediocridade. Em essência, Bolsonaro faz barulho em torno do nada. O presidente deixou entreaberta a porta para um cenário de recuo. Mais à frente, se a vacina testada pelo Butantan se revelar eficaz, o presidente será obrigado a incluí-la no programa nacional de imunização, sob pena de ser responsabilizado judicialmente. Dirá, então, que o governo adquiriu doses da vacina chinesa porque a Anvisa certificou. É precisamente o que declarou o ministro que presidente desautorizou.