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Josias de Souza

Governo vai tornando a oposição desnecessária

Evaristo SA/AFP/Getty Images
Imagem: Evaristo SA/AFP/Getty Images

Colunista do UOL

30/10/2020 18h06

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Considerando-se os movimentos e as declarações das últimas semanas, o governo de Jair Bolsonaro tem um projeto secreto que se sobrepõe a todas as suas iniciativas públicas. A prioridade do governo não é aprovar a agenda liberal de Paulo Guedes. Também não é atenuar os efeitos da crise sanitária. A grande prioridade de Bolsonaro, do vice Hamilton Mourão e da equipe ministerial é tornar os partidos de oposição desnecessários no Brasil. O governo parece determinado a demonstrar que é autossuficiente. Seus integrantes governam e se opõem ao governo.

O fenômeno atingiu o seu ápice com a entrevista do general Mourão à revista Veja. Nela, o vice-presidente disse o contrário de tudo o que vem declarando o presidente. "Essa questão da vacina é briga política com o Doria", disse Mourão. "O governo vai comprar a vacina, lógico que vai. Já colocamos os recursos no Butantan para produzir essa vacina. O governo não vai fugir disso aí."

Num instante em que humilhar militares tornou-se um hábito no governo, Mourão diz em voz alta o que os generais que comandam escrivaninhas no Planalto não podem declarar. Único militar do governo indemissível, o vice-presidente afirma que não hesitará em tomar a vacina chinesa que o presidente refuga, caso ela seja certificada pela Anvisa. E declara que não vê problema em que a gigante tecnológica da China participe do leilão de 5G no Brasil, desde que se comprometa com a "soberania" e a "privacidade". Escancara uma porta que Bolsonaro deseja fechar.

Ao comentar o artigo no qual o general Otávio Rêgo Barros, o ex-porta-voz da Presidência, anota que os compromissos de campanha de Bolsonaro valem tanto quanto uma nota de sete reais, Mourão descolou o governo da caserna. "Forças Armadas são Forças Armadas e política é política". O general não está fazendo senão política. Excluído por Bolsonaro da chapa de 2022, Mourão admite disputar o Senado. Se a conjuntura favorecer, pode ficar mais ambicioso. A sorte do Bolsonaro é que a única novidade que surgiu na oposição é que Lula voltou a conversar com Ciro Gomes.