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Josias de Souza

TCU X Planalto: Vacinação vira balé de elefantes

Colunista do UOL

24/11/2020 20h29

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O absurdo vai ganhando em Brasília uma doce, uma admirável naturalidade. Enquanto a taxa de transmissão do vírus volta a crescer, insensatez tornou-se tão natural que o Tribunal de Contas da União e a Presidência da República decidiram executar um balé de elefantes ao redor do tema mais relevante do momento: a vacinação contra a covid-19. A coreografia é executada em dois atos. Num, o TCU determinou à Casa Civil que apresentasse um plano detalhado para a aquisição, distribuição e aplicação das vacinas. Noutro, a Advocacia-Geral da União usou um argumento chinfrim para descumprir a ordem.

Alegou-se que vacina é problema do Ministério da Saúde, não da Casa Civil. Conversa mole. Sob Jair Bolsonaro, as atribuições da Casa Civil foram redefinidas pela lei 13.844, sancionada em 2019. Prevê que, entre as atribuições do órgão estão a coordenação e o acompanhamento das atividades dos ministérios e da formulação de políticas públicas. No final de março, quando Bolsonaro se indispôs com o então ministro Henrique Mandetta, ordenou ao general Braga Netto, chefe da Casa Civil, que assumisse o comando da comunicação sobre a pandemia. As entrevistas coletivas migraram da pasta da Saúde para o Planalto.

O mundo vive uma aterrorizante onda de contágio viral. Todos rezam para que ela seja controlada pelas vacinas. No Brasil, a contaminação volta a crescer. E a tarefa de controlar o vírus é dificultada pelo descontrole governamental, uma patologia para a qual não há a perspectiva de cura. É inacreditável que o TCU tenha de acionar o Planalto para que o governo cumpra uma obrigação tão comezinha quanto a de informar como planeja vacinar os brasileiros. É inconcebível que, mesmo cutucado, o governo brinque de esconde-esconde, alegando que Braga Netto, o general do Planalto, não pode conversar com Eduardo Pazuello, o general da Saúde.

Numa interpretação mais corrosiva, pode-se alegar que o brasileiro está sendo atacado pelo governo que deveria defendê-lo. As omissões oficiais abrem caminho para o avanço do vírus. Numa leitura mais branda, pode-se considerar que o governo apenas adota um modelo decisório caótico, comparável ao de uma dona de casa que guarda açúcar numa lata de sal, na qual está escrito café. De absurdo em absurdo, o Brasil vai se dando conta da falta que faz um presidente da República.