Como PT não fez autocrítica, eleitor faz autopsia
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O problema da autocrítica é que ela sempre chega tarde. No caso do Partido dos Trabalhadores, demorou demais. Exausto de esperar, o eleitor tornou a autoanálise desnecessária. Decidiu submeter a legenda a uma autopsia. Pela primeira vez desde a redemocratização, em 1985, o PT saiu de uma eleição municipal sem nenhuma prefeitura de capital.
O partido de Lula tinha a ilusão de atenuar o fiasco no segundo turno, pois disputava prefeituras em 15 cidades com mais de 200 mil habitantes. Entre elas duas capitais: a do Espírito Santo (Vitória) e a de Pernambuco (Recife). Perdeu em ambas. Prevaleceu apenas em quatro cidades. Duas em São Paulo: Diadema e Mauá. Duas em Minas Gerais: Juiz de Fora e Contagem.
O PT conseguiu aprofundar a derrocada que sofrera na eleição de quatro anos atrás. Em 2016, amealhara apenas 254 prefeituras no país inteiro. Caiu para 183. Encolheu mais 71 prefeituras. Como se tudo isso fosse pouco, o petismo testemunhou em São Paulo a abertura de uma fenda na hegemonia que ainda supõe exercer na seara da esquerda. A fresta se chama Guilherme Boulos.
Candidato do PSOL à prefeitura da capital paulista, Boulos foi batido pelo tucano Bruno Covas, reeleito com 59,38% dos votos válidos. Mas saiu da disputa com 40,62% dos votos no cesto. Foi uma derrota redentora. Ficou entendido que há vida na esquerda fora do PT, cujo candidato, Jilmar Tatto, amargou no primeiro turno um irrisório sexto lugar, com 8,6% dos votos.
A despeito da eloquência dos sinais, o PT demora a se dar por achado. Presidente da legenda, a deputada federal Gleisi Hoffmann atribuiu o vexame ao que chamou de máquina de mentiras dos adversários e ao dinheiro clandestino que teria irrigado as campanhas rivais.
Se quisesse ser levada a sério, a presidente do PT juntaria meia dúzia de evidências e levaria os casos à Justiça Eleitoral. Sem isso, o discurso de Gleisi fica muito parecido com um lero-lero mau perdedor. A deputada tentou pegar carona no êxito alheio. Declarou que o PT venceu com o PSOL em Belém, ao indicar o vice na chapa do eleito Edmilson Rodrigues.
Num rasgo de generosidade, Gleisi realçou que o petismo apoiou Guilherme Boulos (PSOL) em São Paulo e Manuela D'Ávila (PCdoB) em Porto Alegre. Ambos perderam. Mas, considerando-se o ponto a que chegou o PT, Gleisi vê-se compelida a celebrar até as derrotas alheias. "O PT segue junto com o povo", disse. É como se Gleisi desejasse inovar, tornando-se a primeira piada a dirigir um partido político.
Mais um pouco e até a autopsia deflagrada pelo eleitorado será desnecessária. Não restará senão emitir o atestado de óbito, anotando no espaço dedicado à causa mortis: "Cinismo crônico."
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