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Josias de Souza

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Bolsonaro é inimigo com máscara de presidente

Colunista do UOL

26/02/2021 05h13

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Muita gente acredita que o maior problema de Bolsonaro é saber por onde começar a gestão da pandemia. Engano. O seu maior problema é saber onde parar. Costuma-se dizer que o chefe da nação não gosta de usar máscara. Lorota. Instalou-se no Planalto um inimigo camuflado sob a máscara de presidente.

O Brasil foi transformado numa zona de guerra. O vírus não é o único adversário. Os brasileiros estão sendo violentamente atacados pelo governo. A biblioteca do Palácio da Alvorada virou trincheira. É dali que, em transmissões ao vivo, Bolsonaro faz ataques regulares. Cada frase é um míssil que atinge o país.

"Pessoal, começam a aparecer estudos aqui —não vou entrar em detalhes, né?—sobre o uso de máscaras", disparou o inimigo durante sua penúltima live. "Num primeiro momento aqui, uma universidade alemã fala que elas são prejudiciais a crianças. Começam a aparecer aqui os efeitos colaterais das máscaras..."

Bolsonaro é o efeito colateral de si mesmo. Cada gesto estapafúrdio que ele encena sob a máscara de presidente parece ter sido planejado para confundir o brasileiro, obrigando-o a usar a palavra "estapafúrdio" —um vocábulo quase tão esdrúxulo quanto Pazuello, outro morteiro que atinge a nação.

Num instante em que os mortos da Covid ultrapassam a marca macabra de 250 mil, o capitão do Planalto invade a Petrobras. E o general da Saúde envia para o Amapá as doses de vacina destinadas ao Amazonas.

Aguarda-se a explicação que o general Joaquim Silva e Luna, novo chefe da estatal petroleira, dará sobre as artimanhas logísticas que levam o colega Pazuello a tomar decisões como uma dona de casa cega que guarda sal numa lata de açúcar, na qual está escrito café.

Num bombardeio de dezembro, Bolsonaro soltou sobre o campo de batalha a previsão de que o Brasil vive "um finalzinho de pandemia". Hoje, decorridos dois meses, o país vive a pior fase da pandemia —um caos crescente, com viés de colapso nacional.

Segundo Pazuello, o esdrúxulo, há na praça uma mutação viral que multiplica por três o poder de contágio. O que não impede o presidente mascarado de realizar ataques frontais à inteligência alheia.

"Quem quer auxílio emergencial e a cidade está fechada... Vão cobrar do prefeito, vão cobrar do governador, já que ele quer que você fique em casa eternamente e quer mandar a conta para nós pagarmos."

O presidente mascarado revela-se capaz de tudo, exceto de se enxergar como um corresponsável pela devastação sanitária. O estapafúrdio não se reconhece no reflexo do espelho.

- Atualização feita às 16h20 desta sexta-feira (26/02): Citado por Bolsonaro em sua live, o "estudo" sobre o uso de máscara por crianças é, na verdade, uma enquete mambembe. Coisa imprestável. Nesta sexta, de passagem Ceará, o presidente discursou contra o isolamento social. "O povo não aguenta mais ficar dentro de casa", disse ele (assista abaixo). "Esses que fecham tudo e destroem empregos estão na contramão daquilo que seu povo quer." Como se vê, Bolsonaro não sofre de insanidade. Ele aproveita cada segundo dela.