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Josias de Souza

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Falta às mexidas de Bolsonaro interesse público

Colunista do UOL

29/03/2021 19h26

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Jair Bolsonaro realizou uma reforma ministerial que dizia que não iria fazer. Promoveu seis ajustes na sua equipe. Contando com a recente troca na pasta da Saúde, são sete mexidas. Impulsionadas pelo agravamento da pandemia, essas mudanças no primeiro escalão sinalizam três movimentos preocupantes.

Num, Bolsonaro intensifica os afagos no centrão, entregando a coordenação política do Planalto ao grupo. Noutro, aperta as Forças Armadas, trocando o ministro da Defesa. Num terceiro lance, Bolsonaro tenta proteger a família de futuras complicações, colocando na pasta da Justiça um delegado licenciado da Polícia Federal, Anderson Torres, amigo dos filhos. Devolveu o ministro terrivelmente evangélico André Mendonça para a Advocacia-Geral da União.

Depois de entregar a cabeça do general Eduardo Pazuello, na Saúde, Bolsonaro ofereceu ao centrão o escalpo do antichanceler Ernesto Araújo. Muda o ministro, não necessariamente a política externa, pois ocupará a vaga o embaixador Carlos Alberto Franco França, outro chegado do deputado Eduardo Bolsonaro.

O centrão chegou ao Planalto. Bolsonaro entregou a coordenação política à deputada Flávia Arruda. Pertence ao PL, partido comandado pelo mensaleiro Valdemar Costa Neto. É cupincha do presidente da Câmara, Arthur Lira.

Num movimento surpreendente, Bolsonaro demitiu o ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva. Sinaliza internamente que deseja que as Forças Armadas expressem maior sintonia com o Planalto. Enviou para o posto o chefe da Casa Civil, general Braga Netto, de sua integral confiança. E transferiu o general Luís Eduardo Ramos da articulação política para a Casa Civil.

Na carta de despedida, o general Azevedo e Silva anotou uma frase sintomática: "Preservei as Forças Armadas como instituições de Estado." Isso é uma platitude. E é estranho que o general tenha sentido a necessidade de anotar algo tão trivial. A mudança ocorre dias depois de Bolsonaro insinuar que poderia usar o que chamou de "meu Exército" em reação a medidas restritivas adotadas por governadores.

Na seara política, o aprofundamento da relação de Bolsonaro com o centrão marca o receio do presidente de que o agravamento da pandemia leve a uma perda de sustentação congressual. Pisca no letreiro invisível do Planalto uma palavra incômoda: impeachment.

Nesse ambiente, prevalece uma máxima que o próprio Bolsonaro criou: Ministros são como fusíveis. Para não queimar o presidente, eles se queimam. A questão agora é saber para que Bolsonaro promove as mudanças. Por ora, não há sobre a mesa nada que se pareça com interesse público.