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Josias de Souza

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Falta interesse público no debate sobre o futebol

Fellipe Sampaio /SCO/STF
Imagem: Fellipe Sampaio /SCO/STF

08/06/2021 18h39

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Depois de mobilizar o Executivo e de eletrificar o embate legislativo na CPI da Covid, a Copa América invadiu a grande área do Judiciário. Luiz Fux, presidente do Supremo Tribunal Federal, marcou para esta quinta-feira o julgamento de duas ações que tentam barrar o torneio de futebol, cuja abertura está marcada para domingo.

O julgamento ocorre em caráter extraordinário, no plenário virtual. Os ministros terão 24 horas para informar se são contra ou a favor da realização da competição no Brasil.

Ganha duas doses de vacina quem for capaz de encontrar uma mísera política pública por trás dessa mobilização futebolística. Falta interesse público nesse debate.

Onze em cada dez epidemiologistas avaliam que o Brasil, na antessala de uma terceira onda da pandemia, deveria se abster de recepcionar um torneio que foi refugado por Colômbia e Argentina.

Inquirido na CPI da Covid, o cardiologista Marcelo Queiroga, ministro da Saúde, jogou água na fervura. Disse que há outras competições esportivas em curso no país. E sustentou que o risco de contrair covid é o mesmo "com jogo ou sem jogo."

A oposição acusa o governo de irresponsabilidade sanitária. Bolsonaro e seus operadores dão de ombros. Argumentam que é preciso dar uma alegria aos brasileiros.

Alegria com estádios vazios é coisa duvidosa. Mas o presidente transformou uma competição organizada por entidades privadas numa obsessão. Bolsonaro ameaça pegar em lanças se o Supremo barrar a Copa América a três dias da abertura.

O Brasil está transtornado com uma conjuntura em que se misturam quase 500 mil mortos por covid e mais de 14 milhões de desempregados. Um país submetido a problemas desse tamanho perde o nexo quando atribui prioridade ao circo do futebol. E não é por falta de agenda.

Afora os parafusos que precisam ser apertados na gestão da crise sanitária, há na pauta uma política ambiental comandada por um antiministro crivado de investigações, um MEC entregue a um ministro cujo nome é menos conhecido do que o dos generais do Planalto e uma agenda de reformas que corre no Congresso em ritmo de lesma com covid.

Diante de um cenário assim, espanta a ausência de lideranças capazes de converter o vapor das crises em energia transformadora. A última coisa que o Brasil deveria discutir no momento é o futebol.