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Josias de Souza

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Orçamento subverte o significado de 'contribuinte'

Colunista do UOL

21/12/2021 09h35

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O relator do Orçamento de 2022, deputado Hugo Leal, foi desleal com os brasileiros em dia com a Receita Federal. Ele reservou R$ 16,5 bilhões para aplicar no balcão das emendas do chamado orçamento secreto, que se tornou semitransparente por pressão do Supremo.

Trata-se de uma cota extra de emendas, rateada na base do toma-lá-dá-cá. Há mais R$ 21 bilhões em emendas distribuídas igualitariamente entre parlamentares e bancadas de todas as tendências. No total, os congressistas sequestraram R$ 37,5 bilhões do orçamento.

O relator Leal confirmou também a elevação do Bolsa Eleição. Subiu de R$ 2,1 bilhões para R$ 5,1 bilhões o fundão destinado ao financiamento das eleições de 2022. Alguns parlamentares se deram conta de que falta dinheiro para áreas estratégicas como educação e saúde. Tentam reduzir o fundão para R$ 4,5 bilhões, igualmente inaceitáveis.

Para que o fundão fosse aumentado, o Congresso teve que derrubar, na semana passada, um veto de Bolsonaro. Na mesma sessão, deputados e senadores se abstiveram de analisar o veto do presidente a um projeto que previa a distribuição gratuita de absorventes para meninas pobres de escolas públicas, mulheres em situação de rua e presidiárias. Custaria R$ 84,5 milhões.

Repetindo: os parlamentares reservaram R$ 42,6 bilhões para suas emendas e para suas campanhas eleitorais. Mas não se animaram a separar R$ 84,5 milhões para atenuar o drama de 6 milhões de adolescentes e mulheres que, sem dinheiro para o absorvente, usam coisas como jornal, pano e miolo de pão para lidar com o sangramento menstrual. Meninas chegam a perder 45 dias de aula por ano. Mas isso não é prioritário para o Congressos.

Contribuinte é uma palavra da língua portuguesa que teve o significado deturpado. O governo arranca tudo à força. E depois chama o cidadão de contribuinte. O Congresso Nacional potencializa a deturpação ao analisar anualmente o Orçamento da União.

Não há no Legislativo atividade mais nobre do que a aprovação da lei orçamentária. É nessa hora que os supostos representantes da sociedade decidem gastar o dinheiro em prioridades que não combinam com os interesses dos hipotéticos contribuintes.

Uma parte do dinheiro do orçamento logo sairá pelo ladrão, porque os ladrões continuam entrando no orçamento. Mas há um tipo de corrupção que se manifesta já na elaboração da lei orçamentária: a corrupção de prioridades.