Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Enchentes são tragédias estatais, não naturais
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O enredo é sempre o mesmo. As enchentes começam antes do Natal e invadem o Ano Novo. O que muda é a quantidade de água, cada vez maior. Na atual temporada, o drama foi mais intenso no Sul da Bahia, em Minas Gerais e na região metropolitana de São Paulo. Tornou-se especialmente chocante na cidade fluminense de Petrópolis. Os mortos ainda estão sendo contados. Mas a calamidade trouxe à memória o pesadelo de 11 anos atrás.
Já deveria estar entendido que as mudanças climáticas tornam as chuvas mais severas e letais. O aquecimento é global. Mas a mortandade é local. E o esforço para atenuar os efeitos da catástrofe deveria ser nacional. Para ser levada a sério, a política de prevenção teria de reunir União, estados e municípios num esforço suprapartidário e permanente. Algo que sobrevivesse às trocas de gestão, ultrapassando os mandatos. Um projeto de Estado, não de governos.
Autoridades federais, estaduais e municipais revelam-se incapazes de resolver o problema. Mas são geniais na organização da encenação do ritual que marca a lamentação depois do fato. Recorrem ao sobrevoo de helicóptero para proteger os sapatos da lama. No seco, brindam os contribuintes com a alegação de que as enchentes decorrem do excesso de chuvas.
Anunciam a liberação de verbas emergenciais insuficientes para lidar com a emergência. Falam bem de si mesmos e mal dos outros, inclusive das vítimas —pessoas desavisadas que vão morar em áreas de risco por imprevidência e por "falta de visão de futuro". Quem observa esse espetáculo, tão recorrente quanto enfadonho, percebe que as enchentes são tragédias estatais, não são fenômenos naturais.
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