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Josias de Souza

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Bolsonaro arrasta Biden para cercadinho: voto auditável e exemplo ambiental

Colunista do UOL

10/06/2022 06h15

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No seu primeiro encontro bilateral com Joe Biden, Bolsonaro arrastou o presidente dos Estados Unidos para o seu cercadinho. Falando como se estivesse defronte dos portões do Alvorada, o capitão colocou o sistema eleitoral brasileiro em dúvida —"Queremos eleições limpas, confiáveis e auditáveis"—, mentiu sobre a Amazônia —"Somos um exemplo para o mundo na questão ambiental"— e exercitou sua mania de perseguição —"Por vezes nos sentimos ameaçados em nossa soberania". Foi uma conversa inútil para o interesse nacional. Mas Bolsonaro obteve imagens preciosas para exibir na sua propaganda eleitoral.

Ao dar as boas-vindas a Bolsonaro, Biden referiu-se ao Brasil como uma "democracia vibrante" com "instituições eleitorais fortes". Disse que, a despeito dos esforços brasileiros para preservar a Amazônia, "o resto do mundo precisa ajudar" financeiramente. Se estivesse ali como presidente do Brasil, Bolsonaro teria trocado o lero-lero sobre soberania por um pedido para que Biden traduzisse sua oferta em cifras. Mas a folha de papel na qual o candidato Bolsonaro anotou os tópicos do seu discurso ensaiado não fazia menção a dinheiro.

Mesmo ao defender "uma posição de equilíbrio" em relação à guerra na Ucrânia, Bolsonaro equiparou Biden a um devoto do cercadinho. Injetou nas cenas que usará na campanha a surrada alfinetada nos governadores. Atribuiu a inflação que lhe tira votos à guerra e à política estadual do "fique em casa". Ignorando os 33 milhões de brasileiros que passam fome, disse que "o Brasil alimenta mais de um bilhão de pessoas pelo mundo".

Embora dê pouca atenção à Cúpula das Américas, a imprensa americana percebeu a cilada que Biden armou para si mesmo. O New York Times, por exemplo, anotou que, "esnobado pelos países-chave na América Latina, Biden busca consenso com o Brasil" do capitão.

Ironicamente, a passagem de Bolsonaro pelos Estados Unidos coincide com o início da investigação parlamentar sobre a invasão do Capitólio por golpistas insuflados por Donald Trump. O barulho prolongado da conspiração de Trump soa para a democracia brasileira como uma espécie de síndrome do que está por vir.