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Josias de Souza

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Paulo Guedes vive um processo de sarneyzação

Colunista do UOL

10/06/2022 10h11

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Depois de examinar o comportamento de Paulo Guedes, que se considera um liberal de mostruário, o melhor representante dessa linhagem econômica, uma conclusão se impõe: o ministro não é um economista, mas um ficcionista que venceu na vida.

Convencionou-se dizer que Paulo Guedes bolsonarizou o seu liberalismo. Engano. É muito pior. No esforço para subordinar suas teorias econômicas às conveniências eleitorais do chefe, o ministro promove a sarneyzação de sua biografia.

Numa videoconferência com donos de supermercados, Bolsonaro pediu o "menor lucro possível' na comercialização dos produtos da cesta básica. Mais incisivo, Guedes foi ao ponto: "Nova tabela de preços só em 2023. Travem os preços. Vamos parar de aumentar os preços por uns dois, três meses. Nós estamos em uma hora decisiva para o Brasil."

O que Bolsonaro e Guedes disseram aos empresários, com outras palavras, foi mais ou menos o seguinte: "Ou vocês ajudam a segurar o preço da comida, para atenuar a irritação do eleitorado pobre, ou vão acabar elegendo o Lula." Isso tem nome. Chama-se terrorismo eleitoral.

Não é a primeira vez que um governo trama o congelamento de preços com fins eleitorais. Em todas as ocasiões anteriores, o resultado foi catastrófico.

O caso mais célebre ocorreu em 1986. Cavalgando o congelamento de preços decretado pelo Plano Cruzado, o PMDB do então presidente José Sarney elegeu 22 governadores, 36 senadores e a maioria dos deputados. Isso também tem nome: estelionato eleitoral.

Depois da fraude política, vieram a explosão dos preços represados, o aprofundamento da ruína e vários planos econômicos frustrados. Sobreveio um desastre com cara de abismo: Fernando Collor de Mello.

Paulo Guedes se orgulha de ter sido aluno de Mário Henrique Simonsen antes de "lapidar" seus conhecimentos na Universidade de Chicago. Simonsen costumava dizer que, "em teoria econômica, o que não é óbvio quase sempre é besteira."

Guedes não emburreceu a ponto de desaprender que o congelamento de preços é a pior forma de combater uma inflação de 11,73% acumulada em doze meses. Mas o ministro está submetido à logica de uma Brasília. Uma cidade que se parece com a Chicago de Al Capone, não com a sede da célebre universidade.

Nessa Brasília mafiosa, onde o centrão dá as cartas, o que importa é a perspectiva de lucro eleitoral em outubro. Às favas com a explosão que virá em 2023. Mais um pouco e Paulo Guedes dará bom dia à Venezuela.