Exército diz ter dificuldade para desligar até oficial sequestrador
O general Tomás Paiva, comandante do Exército, vive uma realidade paradoxal. Considera vital punir com rigor militares envolvidos em crimes contra a democracia e outras delinquências. Mas alega que a legislação impõe dificuldades para conciliar desejo e prática. Em conversa com a coluna, o general contou que não conseguiu desligar do Exército nem mesmo um capitão preso em flagrante por tráfico de drogas e um tenente envolvido com sequestro relâmpago.
Segundo o general, é mais fácil punir os militares indisciplinados do que os processados judicialmente por crimes graves. "Quando o camarada não se adapta à disciplina, eu posso abrir contra ele o Conselho de Justificação. Mas não posso abrir quando o caso está no âmbito da Justiça", disse Tomás Paiva. "Temos que esperar o trânsito em julgado da sentença. Isso demora."
O Conselho de Justificação é uma espécie de tribunal de honra dos militares. Nele, tramitam processos administrativos que, no limite, podem resultar na expulsão de oficiais considerados indignos de integrar os quadros das Forças Armadas. Nos processos judiciais, o desfecho é mais lento. "Se for condenado a mais de dois anos de prisão", disse Tomás Paiva, "o Ministério Público Militar representa contra o oficial junto ao Superior Tribunal Militar. Normalmente, demora mais um ano."
Tomás Paiva disse que queria "mandar embora de imediato" o capitão traficante e o tenente sequestrador. Lamentou não ter conseguido "fazer os desligamentos, porque o entendimento que a gente tem é que tem que esperar o trânsito em julgado da sentença". Ambos estão em São Paulo. O traficante, já condenado em primeira instância, cumpre prisão em regime semiaberto. O sequestrador, com formação na Academia Militar das Agulhas Negras, está preso na Polícia do Exército.
O general revelou desconforto ao comentar as aparições públicas do tenente-coronel Mauro Cid uniformizado. Disse ter explicado até para Lula que o uso do traje é um direito assegurado aos oficiais da ativa pelo Estatuto dos Militares. Contou que o coronel Jean Lawand Júnior pediu autorização para depor à CPI do 8 de Janeiro, no mês passado, em trajes civis. "Eu rapidamente concedi a autorização", disse Tomás Paiva.
O comandante do Exército recordou que, na época em que foi ajudante de ordens do então presidente Fernando Henrique Cardoso, interrompeu as atividades durante a campanha à reeleição. Nessa época, disse ele, quem trabalhava na ajudância de ordens era orientado a não usar farda, "para separar atos de Estado de eventos partidários". Lamentou que isso tenha "se misturado".
Tomás Paiva disse que sua "grande preocupação é a de não cometer arbitrariedade". Avalia que isso não se confunde com passividade. Revelou que, quando ainda atuava como comandante militar do Sudeste, puniu um oficial que postou nas redes sociais foto uniformizado em evento de campanha com Bolsonaro. "Ele pegou cadeia e ninguém ficou sabendo."
No comando do Exército, Tomás Paiva anulou a nomeação do coronel Lawand Júnior para um posto no exterior. E afastou do Gabinete de Segurança Institucional todos os militares suspeitos de ter contribuído, por inação, com a invasão do Planalto no 8 de Janeiro.
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