Lula despreza o efeito Trump ao citar 2026 em reunião ministerial
Se o retorno de Donald Trump à Casa Banca serve para alguma coisa é para sinalizar que um governo apenas mediano, como foi o de Joe Biden, não é suficiente para afastar o risco de volta do grotesco ao Poder. Trump não é propriamente um bom exemplo. Mas representa um extraordinário aviso. Tomado pelo script da reunião ministerial que realizou em Brasília nesta segunda-feira, Lula ignora os sinais vindos de Washington.
Lula soou paradoxal. Declarou aos ministros que "2025 é o grande ano da colheita". Dizia a mesma coisa sobre 2024. Mas admitiu que "muitas das coisas que nós plantamos ainda não brotaram e não nasceram". Convidou os ministros a "capinar, porque porque temos que tirar todo carrapicho que tiver nas plantas que nós plantamos". Simultaneamente, proclamou que "2026 já começou."
A certa altura, Lula afirmou que seu governo entra numa fase de "reconstrução, união e alimentos baratos na mesa do trabalhador." Reconheceu que "os alimentos estão caros". Disse que "todo ministro sabe que o alimento está caro. E é uma tarefa nossa fazer com que os alimentos cheguem baratos à mesa do trabalhador." Em vez de dar mão forte a Fernando Haddad, deu uma paulada no ministro da Fazenda.
Numa alusão à crise do Pix, Lula disse que, "daqui para frente, nenhum ministro vai poder fazer uma portaria que depois crie confusão para nós sem que passe pela Casa Civil." Caprichou na bronca: "Muitas vezes a gente pensa que não é nada, faz um negócio qualquer e depois arrebenta e vem cair na Presidência da República."
Na eleição municipal de 2014, Lula e o PT foram como que engolfados pela onda conservadora que varreu as urnas. Nesta segunda-feira, o presidente reiterou que seu governo não consegue se comunicar com o pequeno "empreendedor", eufemismo para o trabalhador que rala para encher a geladeira à margem da CLT.
"É importante que a gente compreenda que o povo que estamos trabalhando hoje não é o povo dos anos 1980, não é povo que queria apenas ter emprego numa fábrica com carteira assinada, é um povo que está virando empreendedor e gosta de ser empreendedor", lecionou Lula aos ministros.
"Nós precisamos aprender a trabalhar com essa nova característica e formação do povo brasileiro. Temos que ser muito exigidos. Não reclamarei se o povo nos cobrar, reclamarei se a gente não tiver capacidade de entregar tudo que aquilo que nós nos comprometemos", disse Lula, abstendo-se de repreender o companheiro Luiz Marinho, um ministro do Trabalho que fracassou na missão de regulamentar o trabalho por aplicativo e voltou a falar na ressurreição do imposto sindical.
No alvorecer do terceiro ano de mandato, Lula ainda não se deu conta de que o único lugar onde a reeleição vem antes do trabalho é no dicionário. Fora do Aurélio, um político que prometeu na campanha eleitoral que seria "presidente de um mandato só" e faz da sua terceira Presidência um palanque ininterrupto para o quarto ciclo, flerta com a insensatez.
No Brasil, o grotesco está inelegível. Bolsonaro está mais próximo da cadeia do que das urnas. Mas o capitão já esclareceu que pretende imitar Lula. Trama registrar sua candidatura presidencial no TSE, acomodando na vice uma opção paleolítica qualquer que possa substituí-lo na cabeça da chapa. Ao ignorar os sinais vindos dos Estados Unidos Lula potencializa a percepção de que não perde a oportunidade de perder oportunidades.
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