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Josmar Jozino

REPORTAGEM

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Faltas graves barram semiaberto para membros do PCC que assassinaram juiz

Juiz Antônio José Machado Dias, assassinado em 2003 a mando do PCC - Divulgação
Juiz Antônio José Machado Dias, assassinado em 2003 a mando do PCC Imagem: Divulgação

Colunista do UOL

03/08/2021 04h00

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Era uma manhã de sábado, 10 de julho de 2021, dia de visita na Penitenciária 2 de Presidente Venceslau, o mais forte reduto do PCC (Primeiro Comando da Capital). No pavilhão 2 da unidade, 25 presos tentaram burlar a vigilância, fazendo cabanas com lençóis e panos na quadra para receber seus familiares.

Os prisioneiros foram acusados de cometer falta grave e respondem a PID (Procedimento Interno Disciplinar).

Segundo a SAP (Secretaria Estadual da Administração Penitenciária), na lista dos indisciplinados consta o nome de Ronaldo Dias, 44, o Chocolate. Ele é um dos condenados pelo assassinato do juiz Antônio José Machado Dias, o Machadinho, como era chamado.

O magistrado era corregedor da Vara das Execuções Criminais de Presidente Prudente, responsável pelos presídios da região Oeste do estado, justamente as prisões que abrigam os prisioneiros do PCC considerados de altíssima periculosidade. Machadinho foi morto a tiros na cidade no dia 14 de março de 2003, logo após encerrar o expediente no fórum daquela comarca.

Falta de natureza grave

Chocolate, condenado a uma pena total de 47 anos e oito meses, atingiria o lapso para ser beneficiado com o regime semiaberto no dia 18 de julho de 2021. Porém, oito dias antes, ele foi acusado de cometer a falta de natureza grave. Por causa da indisciplina, ele não conseguiu o benefício.

O UOL teve acesso exclusivo das fotos das cabanas feitas pelos presos na quadra. Veja uma delas abaixo:

cabanas - Reprodução - Reprodução
Imagem de julho de 2021 mostra presos fora das celas e estruturas de "cabanas" sendo montadas
Imagem: Reprodução

Um relatório feito pela SAP diz que Chocolate é prisioneiro de altíssima periculosidade, passível de ser resgatado e com histórico de faltas disciplinares internas. O documento informa que ele cometeu crime grave de grande repercussão: o homicídio do juiz, a pedido da facção criminosa PCC.

Exame Criminológico

Comparsa de Chocolate e também condenado pela morte do juiz, Adilson Daghia, 52, o Ferrugem, tem em seu prontuário oito faltas de natureza grave. Ele está preso na Penitenciária 1 de Avaré e já respondeu a processo disciplinar por desobediência, desrespeito e subversão à ordem na prisão.

Ferrugem é condenado a uma pena total de 62 anos. Para o MPE (Ministério Público Estadual), o preso é de alta periculosidade, tem a personalidade deturpada e demonstra desajuste social, sendo prematuro conceder a ele a progressão do regime semiaberto.

Para a Justiça, o exame criminológico ao qual Ferrugem foi submetido mostrou que não houve unanimidade na recomendação do benefício do semiaberto. O juiz Diego Bocuhy Bonilha, da 5ª Vara das Execuções Criminais, indeferiu o pedido.

As investigações sobre o assassinato do juiz Machadinho apontaram que Ferrugem chegou a comprar um terno e entrou várias vezes no fórum de Presidente Prudente, tentando se passar por advogado, para conseguir detalhes da rotina do magistrado.

Segundo a Polícia Civil, Ferrugem descobriu que às sextas-feiras, Machadinho saía do serviço sem escolta. Foi o que aconteceu no final da tarde de 14 de março de 2003. O magistrado foi emboscado e acabou morto a tiros nas imediações do fórum.

Presídio federal

O preso Reinaldo Teixeira dos Santos, 43, o Funchal, foi acusado de ter atirado no juiz. A condenação total dele é de 66 anos, 10 meses e 20 dias de prisão. O detento cumpria pena na Penitenciária 2 de Presidente Venceslau, mas foi transferido para a Penitenciária Federal de Brasília no início de 2019.

Funchal já respondeu a dez faltas de natureza grave no sistema prisional paulista. De acordo com o serviço de inteligência da SAP, em 2018 foi descoberto um plano para resgatar o preso e outros 20 detentos da Penitenciária 2 de Presidente Venceslau. Todos acabaram transferidos para unidades federais.

Advogados de Funchal lutam na Justiça para conseguir o retorno do cliente para um presídio de São Paulo. Segundo os defensores, Funchal não integra organização criminosa; o plano de resgate na Penitenciária 2 de Presidente Venceslau nunca foi provado e a SAP jamais juntou documento que comprove ou demonstre risco do retorno de Funchal para o estado de origem.

Os advogados de Chocolate e de Ferrugem sustentam que ambos não são integrantes do PCC e de nenhuma outra organização criminosa; têm bom comportamento carcerário - atestado pela SAP - e já atingiram o lapso para cumprir a pena em regime semiaberto.