Traficante preso pela PF tinha 'chave do Deic', disse delator do PCC ao MP
Um traficante de drogas preso pela Polícia Federal em junho de 2008, na zona leste da capital, "tinha, em 2022, a chave do Departamento Estadual de Investigações Criminais, um dos mais importantes departamentos da Polícia Civil de São Paulo, e pagava propina para policiais da unidade".
A revelação foi feita ao Gaeco (Grupo de Atuação Especial e de Combate ao Crime Organizado), subordinado ao MP-SP (Ministério Público do Estado de São Paulo, por Antônio Vinícius Lopes Gritzbach, 38, assassinado a tiros no aeroporto internacional de Guarulhos, no dia 8 de novembro.
A denúncia feita por Gritzbach foi gravada por promotores de Justiça e fez parte do acordo de delação premiada firmado por ele com o MP-SP e homologado pela Justiça. O UOL teve acesso ao vídeo de 30 minutos. O delator deu o nome e o apelido do traficante de drogas.
Segundo Gritzbach, o criminoso foi um dos homens que o sequestraram e o levaram para um cativeiro em janeiro de 2022, no Tatuapé, zona leste de São Paulo. O delator acrescentou que o DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa) havia aberto um inquérito para apurar o sequestro.
Ele contou ainda que o inquérito foi avocado pelo Deic, mas o departamento não investigou quem eram os sequestradores e arquivou o caso. À Polícia Civil, Gritzbach chegou a revelar quem eram os sequestradores. O traficante é apontado como suspeito de ser um dos mandantes da morte dele.
Revelou nome e apelido
O empresário forneceu o nome e apelido dele ao Gaeco. E disse que o criminoso pagou propina para que policiais do departamento não cumprissem mandados de busca e apreensão em endereços ligados aos sequestradores. Ele não deu os nomes dos supostos corruptos.
Gritzbach afirmou que soube do pagamento da propina pelos investigadores Valdenir Paulo de Almeida, 57, o Xixo, e Valmir Pinheiro, 55, o Bolsonaro. Ambos foram presos pela PF em setembro deste ano, acusados de receber de R$ 800 mil do narcotraficante João Carlos Camisa Nova Júnior, 36.
Em 31 de outubro deste ano, oito dias antes de morrer, Gritzbach, delator de integrantes do PCC (Primeiro Comando da Capital), procurou a Corregedoria da Polícia Civil para denunciar policiais supostamente envolvidos em corrupção.
A Casa Censora instaurou dois inquéritos para apurar as denúncias. Um deles envolve agentes do DHPP. Já o outro tenta identificar se policiais do Deic receberam mesmo propina de um traficante de drogas citado por Gritzbach nas delações. As investigações estão sob segredo de justiça.
O delator contou ao Gaeco que já havia sido ouvido pela Corregedoria da Polícia Civil em outra oportunidade, quando esteve preso na Penitenciária 1 de Presidente Venceslau, na região oeste do estado.
Ele ficou preso sob a acusação de ter mandado matar o narcotraficante Anselmo Becheli Santa Fausta, 38, o Cara Preta, homem influente no PCC, e o motorista Antônio Corona Neto, o Sem Sangue, 33, em dezembro de 2021 no Tatuapé.
Foi por causa dessas mortes que Gritzbach foi submetido a um "tribunal do crime" no cativeiro. Os sequestradores eram muito ligados a Cara Preta. O MP-SP o denunciou à Justiça pelo duplo homicídio. Ele virou réu e foi solto em 7 de junho de 2023.
Com medo de ser morto, Vinícius Gritzbach contratou ao menos oito policiais militares para cuidar de sua segurança pessoal. Todos foram afastados do serviço e estão sendo investigados pela Corregedoria da PM. Mesmo com essa escolta, o empresário acabou morto com dez tiros de fuzis no maior e mais movimentado aeroporto do Brasil.
Até agora, a força-tarefa prendeu dois suspeitos investigados por suposta participação na morte de Vinícius Gritzbach. Os mandantes do crime ainda não foram formalmente identificados.
O que diz o Deic
Policiais do Deic ouvidos pela reportagem disseram que não avocaram o inquérito sobre o sequestro de Gritzbach e que apenas receberam, depois de um ano, e relataram. Acrescentaram que quando o inquérito chegou ao Deic já estava pronto; 95% dos envolvidos tinham sido ouvidos e não havia mais filmagens nem provas técnicas para fazer. Além disso, o MP não pediu nenhuma cota.
Ainda segundo o Deic, Gritzbach, quando foi ouvido sobre o sequestro no DHPP, não reconheceu por foto o próprio traficante de drogas que delatou. Agentes do Deic disseram que Gritzbach enganou todo mundo, incluindo o MP, com uma delação estapafúrdia e quis se passar por santo, mas na realidade era "bandido".
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