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Juliana Dal Piva

REPORTAGEM

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Na posse de Biden, reverendo diz que representou ancestrais escravizados

Reverendo Silvester Beaman cumprimenta Joe Biden durante a posse do presidente dos EUA, em 20 de janeiro passado - Reprodução
Reverendo Silvester Beaman cumprimenta Joe Biden durante a posse do presidente dos EUA, em 20 de janeiro passado Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

14/02/2021 04h00

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A cerimônia de posse do novo presidente dos EUA, Joe Biden, também marcou um momento especial para o reverendo Silvester Beaman da Bethel AME, uma igreja metodista episcopal afro-americana localizada em Wilmington, no estado de Delaware. O religioso é amigo do presidente desde os anos 1990 e foi chamado para fazer a benção final na cerimônia de posse.

Em entrevista à coluna, Beaman contou que sabia que estava representando ancestrais que foram escravizados durante a construção do prédio do Capitólio, sede do Congresso americano inaugurada em 1800, e procurou fazer uma benção para unir o país. O convite para a benção foi feito pelo presidente Biden no dia 3 de janeiro. Dias depois, o ataque ao Capitólio comoveu o país. Assim, diz ele, se viu inspirado pela preocupação com a violência daquele dia.

"Senti que precisava representar meus ancestrais, eu estaria no prédio que escravos construíram", contou ele, ao afirmar que o momento simbolizava também para a história de sua própria igreja que combateu o racismo ao longo dos anos. "Você não pode falar da América sem se dar conta de que Cristóvão Colombo não a descobriu. Como ele descobriu algo se já existiam pessoas vivendo aqui?"

A coluna apurou que, além da relação pessoal, a escolha pelo religioso também foi vista como mais um gesto de aproximação da administração de Biden com a comunidade afro-americana que cobra mudanças para prevenir o racismo estrutural após os protestos contra os assassinatos de negros nos EUA e a eclosão do movimento Black Lives Matter.

"Mesmo que africanos tenham sido trazidos para serem escravizados aqui, agora temos uma vice-presidente negra. Esse é o nosso país. E para as pessoas que fazem parte da comunidade LGBT, esse é o nosso país. Independente de quem se escolhe amar, é o nosso país. Batista, metodista, judeu, é melhor nós aprendermos a viver, amar e se reconciliar nesse país ou vamos perder a benção que Deus nos deu", disse ele.

Beaman contou que a administração de Donald Trump representou "quatro anos muito difíceis" e que ficou bastante assustado ao ver as pessoas serem enganadas com tantas mentiras e incitação ao ódio.

beaman - Divulgação - Divulgação
Reverendo Silvester Beaman caminha por sua igreja na cidade de Wilmington (EUA)
Imagem: Divulgação

Sobrinha é diplomata e mora no Rio

Beaman contou à coluna que quem viu do Rio de Janeiro, emocionada, sua participação na posse foi a diplomata Tyra Beaman, sua sobrinha. Ela está trabalhando no Consulado americano na capital fluminense e chegou no início de janeiro. Tyra contou que conheceu o presidente Biden quando estava na faculdade e dele recebeu uma moeda que guarda há muitos anos para dar sorte: "Senti que ele (Biden) acreditava em mim".

A diplomata contou que ainda está se adaptando e lendo livros da filósofa Djamila Ribeiro para entender o Brasil. " O trabalho dela para mim é inspirador e acho que é importante para as mulheres negras nos EUA conhecer", contou. "Sou uma orgulhosa mulher negra, tenho orgulho de representá-las ao redor do mundo", disse.

Tyra afirmou não ter visto episódios de racismo no Brasil, mas sabe que existem. "Não enfrentei racismo aqui, mas sei que existe porque faz parte da história do Brasil, como nos EUA. Mas o importante é que nossos países são democracias e em espaços democráticos nós precisamos entender e reconhecer o passado e as dificuldades, mas sabendo que, para o futuro, precisamos colocar pessoas que representam todos os grupos".

Nesse momento inicial no Brasil, ela disse que está morando sozinha e, por causa da pandemia, está mantendo distanciamento social. "Espero que nesses dois anos eu tenha a oportunidade de ver as bonitas pessoas dessa cidade e aprender sobre brasileiros e o legado que vocês todos têm. Acho que é em maio que vocês celebram o feriado da abolição da escravidão", disse Tyra.