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Juliana Dal Piva

REPORTAGEM

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Ex-mulher de Bolsonaro fez chantagem para usar sobrenome na eleição em 2018

Colunista do UOL

07/07/2021 04h00

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A fisiculturista Andrea Siqueira Valle contou, em gravações obtidas pela coluna com exclusividade, que a irmã, a advogada Ana Cristina Siqueira Valle, segunda mulher de Jair Bolsonaro, fez chantagem com o presidente durante a eleição de 2018 para usar o sobrenome "Bolsonaro" na candidatura de deputada federal daquela disputa.

O material exclusivo está no podcast UOL Investiga: "A vida secreta de Jair", cujo segundo episódio é lançado hoje. Você pode ouvir UOL Investiga - A Vida Secreta de Jair no UOL, no Youtube e em todas as plataformas de podcasts, como Spotify, Apple Podcasts, Google Podcasts e Amazon Music.

Naquele ano de 2018, apesar de nunca ter adotado o sobrenome do ex-marido, Ana Cristina passou a usá-lo para concorrer a uma vaga no Congresso Nacional pelo Podemos. Ela obteve 4.555 votos e não conquistou uma cadeira.

"A Cristina falou para mim. Se o Jair não deixar eu usar o nome dele por bem, eu vou usar por mal. Então quer dizer, ela fez chantagem com ele para poder usar o nome dele, né. Porque a menina lá, a secretária, disse que ela saiu do gabinete depois que conversou com ele, chorando", contou Andrea, em uma gravação obtida pela coluna.

Ouça no segundo episódio do podcast UOL Investiga: A vida secreta de Jair a partir de 9 minutos e 5 segundos.

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Ana Cristina é a segunda ex-mulher de Jair Bolsonaro

Andrea contou sobre a chantagem e admitiu o esquema de devolução de salários tanto de André Siqueira Valle, irmão mais novo, como dela mais de uma vez e para duas pessoas ouvidas pela coluna. Andrea contou que recebia uma mesada de R$ 1 mil como funcionária fantasma no antigo gabinete de Flávio Bolsonaro na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio) e devolvia outros R$ 7 mil.

O advogado Magnum Cardoso, que atua na defesa de Ana Cristina Valle e sua família, inclusive os pais de Ana Cristina e Andrea, disse por nota que os clientes decidiram que não iriam se pronunciar. Procurada para falar das gravações, Andrea leu as mensagens da coluna e depois bloqueou os contatos no telefone e nas redes sociais.

Os advogados Luciana Pires, Rodrigo Roca e Juliana Bierrenbach, que representam o senador Flávio Bolsonaro no caso da rachadinha na Alerj, emitiram nota dizendo que "gravações clandestinas, feitas sem autorização da Justiça e nas quais é impossível identificar os interlocutores não é um expediente compatível com democracias saudáveis". Os advogados disseram que, por isso, a defesa se sentia "impedida de comentar o conteúdo desse suposto áudio apresentado pela reportagem".

Já sobre Andrea Siqueira Valle, a defesa de Flávio afirma que "ela trabalhou na Alerj e cumpria sua jornada dentro das regras definidas pela Assembleia. Flávio Bolsonaro, nas suas atividades parlamentares, não tinha como função fiscalizar e orientar a forma como a servidora usufruía do seu salário".

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Ana Cristina Valle, Jair Bolsonaro e Andrea Siqueira Valle

A segunda ex-mulher

Atualmente, a segunda mulher do presidente trabalha como assessora da deputada Celina Leão (PL-DF). Ana Cristina viveu em união estável com o agora presidente Jair Bolsonaro entre 1998 e 2007. Juntos, eles tiveram Jair Renan Bolsonaro, o "04", como o presidente costuma se referir. No entanto, desde a separação os dois possuem uma relação conturbada.

A coluna ouviu de pessoas do entorno do presidente que a ex-mulher precisa ser "administrada". Confira o perfil de Ana Cristina publicado em maio.

Depois que a separação de Ana Cristina e Jair Bolsonaro se consumou, ela entrou com um processo na 1ª Vara de Família do TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro) para reconhecimento da união estável. Lá, a advogada pediu a divisão de bens, pensão e contou que Bolsonaro tinha uma "próspera condição financeira" que dava uma renda de R$ 100 mil mensais. Ana Cristina, porém, nunca explicou a origem desse valor.

Oficialmente, o salário bruto de Bolsonaro na Câmara na época era de R$ 26,7 mil, somado a outros R$ 8,6 mil como militar da reserva. Ela era, na época, chefe de gabinete de Carlos Bolsonaro e recebia R$ 10 mil. O caso foi revelado pela revista Veja, quando Bolsonaro disputava a presidência em 2018, pouco antes do primeiro turno.

Depois de muitas discussões, com direito a acusações de ameaça de morte e roubo, o casal entrou em acordo em 2011. A advogada ficou com nove imóveis, a maior parte dos bens. No acordo, porém, ela abriu mão da guarda de Jair Renan, que cresceu aos cuidados de Bolsonaro e de Michelle, a terceira mulher do presidente e atual primeira-dama, com quem o rapaz nunca se deu muito bem.

Com a venda de um apartamento e cinco terrenos, Ana Cristina obteve mais de R$ 2 milhões e passou alguns anos vivendo na Noruega, onde se casou novamente. Quando retornou ao Brasil, seguiu fazendo negócios com dinheiro em espécie.

Em 11 de outubro de 2013, comprou um terreno de 420 metros quadrados e, conforme a escritura, pagou R$ 135 mil em dinheiro vivo. Nesse local, no bairro da Morada da Colina, em Resende, ergueu uma casa de dois pisos, quatro quartos e piscina - o mesmo imóvel que ela deixou para voltar a Brasília e que agora alugou por cerca de R$ 6 mil.

Além desse imóvel, avaliado em mais de R$ 1 milhão, o patrimônio de Ana Cristina é composto pela casa dos pais, também em Resende, estimada em mais de R$ 260 mil; duas salas comerciais no centro do Rio, que valem cerca de R$ 1 milhão; e um apartamento na Barra da Tijuca, também avaliado em R$ 1,2 milhão. Um total de, pelo menos, R$ 3,5 milhões.