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Ao se distanciar do PT, Ciro reforça cacife de Flávio Dino na esquerda

Flávio Dino (PCdoB), governador do Maranhão, participa do UOL Entrevista - Reprodução/UOL
Flávio Dino (PCdoB), governador do Maranhão, participa do UOL Entrevista Imagem: Reprodução/UOL

Colunista do UOL

02/12/2020 12h54

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A entrevista de Ciro Gomes (PDT) ao UOL joga uma ducha de água fria numa frente ampla de partidos de centro-esquerda e esquerda para 2022. Ele equiparou o bolsonarismo ao lulopetismo, recorrendo a uma falsa equivalência que só cria problemas para reunir forças contra o atual presidente da República.

Apesar de um encontro recente com o ex-presidente Lula no qual os dois teriam abordado suas diferenças com franqueza, Ciro tem deixado claro que seu caminho no primeiro turno de 2022 passa longe do PT. Como disse ao colunista Leonardo Sakamoto, ele espera capturar uma fatia da centro-direita para formar uma aliança com forças de centro e centro-esquerda. Sonha com uma união entre o DEM e PDT, PSB, Rede e PV.

Ciro tentou essa fórmula em 2018, mas não deu certo. O DEM se valoriza perante os tucanos e o apresentador de TV Luciano Huck quando acena para o pedetista, mas a base conservadora do partido dificulta uma aliança.

As afirmações de Ciro após os resultados das eleições municipais, dizendo que bolsonarismo e lulopetismo foram banidos nas urnas, devem ser vistas com certa cautela.

O presidente Jair Bolsonaro ainda é o nome mais forte do campo que vai da centro-direita à extrema-direita. Para capturar forças de centro, Ciro deverá enfrentar a concorrência de Huck, se ele não desistir novamente de uma aventura presidencial, do governador de São Paulo, João Doria, e de outros tucanos.

O PT continua a ser o partido mais relevante do segmento de centro-esquerda e esquerda. Sem a base petista, Guilherme Boulos (PSOL-SP), Manuela D'Ávila (PCdoB) e José Sarto (PDT-CE) não teriam tido o bom desempenho que obtiveram. Boulos e Manuela perderam em São Paulo e Porto Alegre, mas fizeram campanhas de renovação no campo da esquerda. Sarto se elegeu prefeito de Fortaleza com apoio do governador petista Camilo Santana.

Candidatura à la Kirchner?

A movimentação de Ciro gerou novas conversas sobre o futuro do PT em 2022. Uma parcela do partido parece convencida da necessidade de adotar a estratégia argentina: ficar com a vice numa chapa presidencial, seguindo o exemplo de Cristina Kirchner, que aceitou ser a número dois de Alberto Fernández.

Nesse cenário para combater o antipetismo com pragmatismo, quem tem se fortalecido para encabeçar uma chapa presidencial com suporte petista é o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB). Dino faz gestos políticos de respeito a Lula e ao petismo. Ao se distanciar do PT como faz, Ciro reforça o cacife político do governador do Maranhão no tabuleiro da centro-esquerda e esquerda.

Uma outra ala do PT acredita que o partido deva ter a cabeça de chapa, avaliando que um novo duelo aconteceria com Bolsonaro e que o desfecho seria diferente de 2018.

Os candidatos seriam Lula, se ele se livrar dos obstáculos judiciais, ou o ex-prefeito Fernando Haddad, que concorreu há dois anos. Há outros nomes, como o do senador Jaques Wagner (PT-BA). Nesse cenário, Dino poderia ser vice de um petista.

Cálculos para 2022

O bom desempenho do PSOL nas eleições municipais também fortaleceu o cacife do partido nas negociações de uma frente de centro-esquerda e esquerda. O PSOL tem atraído um eleitorado mais jovem que se distanciou do PT. Um nome do partido poderia ser vice, mas dificilmente encabeçaria uma chapa do campo de centro-esquerda e esquerda.

Aos olhos de hoje, uma aliança entre PT, PCdoB e PSOL parece ter mais chance de chegar ao segundo turno do que a frente imaginada por Ciro. O PT foi mal nas eleições municipais. Não adianta tapar o sol com a peneira. Mas é um erro político desprezar o impulso que a base petista dá a um candidato presidencial na primeira fase. Basta ver o desempenho de Haddad, que chegou ao segundo turno com uma candidatura de última hora em 2018.

Outro equívoco é levar os resultados das eleições municipais de 2020 como um vaticínio sobre o que acontecerá em 2022. Há recados claros, como o enfraquecimento do bolsonarismo, a resiliência do antipetismo alimentado pela Lava Jato e a sugestão de que uma frente a mais ampla possível seria mais competitiva. Mas há muita água para passar debaixo da ponte. Fechar portas com antecedência não é recomendável.

No PT, há um movimento para estimular o lançamento de puxadores de voto nas eleições para deputados federais. Estrelas do partido fora de candidatura majoritária (presidencial ou nos estados) deveriam reforçar uma estratégia de ampliar a bancada na Câmara dos Deputados. Faz muito sentido.