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Kennedy Alencar

OPINIÃO

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Censo a mando do STF é nova intromissão indevida no Executivo e Legislativo

Ministro do STF Marco Aurélio Mello - Felipe Sampaio/STF
Ministro do STF Marco Aurélio Mello Imagem: Felipe Sampaio/STF

Colunista do UOL

28/04/2021 14h57

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É óbvio que realizar o Censo do IBGE neste ano seria uma política pública responsável e prioritária. Deixar de realizá-lo, como decidiu o governo Bolsonaro, é um absurdo.

O Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística é uma ferramenta básica para a formulação de políticas públicas da União, Estados e municípios. É fundamental para pesquisas e propostas das universidades, de empresas privadas, da imprensa, da sociedade civil como um todo. É vital para o presente e o futuro do país.

O mapeamento demográfico feito pelo IBGE já está atrasado, pois deveria ter acontecido no ano passado. Mas a realização do levantamento não deveria decorrer de uma decisão do Supremo Tribunal Federal.

Trata-se de uma interferência indevida nos assuntos dos Poderes Executivo e Legislativo, que elaboram e aprovam o Orçamento Geral da União. Não há dúvida das boas intenções da decisão monocrática do ministro do STF Marco Aurélio Mello, dada hoje.

No entanto, não deveria ser assunto do Supremo Tribunal Federal impedir posse de ministros de Estado, como ocorreu nos governos Dilma e Temer, e determinar a realização de uma decisão que, em última instância, pertence ao Executivo, como é o caso do Censo do IBGE. Ordenar a instalação de uma CPI, como fez recentemente o STF, é reconhecer o direito da minoria parlamentar que está expresso na Constituição.

Como guardião da Constituição, cabe ao STF fazer, sim, interferências quando baseadas na Carta Magna. Mas, nos últimos anos, há uma enxurrada de intromissões indevidas do Judiciário no Executivo e no Legislativo que só enfraquecem os Três Poderes e suas atribuições.

Difícil ver uma sustentação jurídica constitucional para obrigar o governo federal a fazer o Censo. Essa realização deveria ocorrer por pressão dos políticos e da sociedade civil, não por ordem judicial.

O ministro Marco Aurélio atendeu a um pedido do governo do Maranhão. Apesar da pertinência da realização, é preciso ter uma interpretação elástica da Constituição para ver amparo legal à justificativa do ministro Marco Aurélio: "Ao deixarem de realizar o estudo no corrente ano, em razão de corte de verbas, descumpriram o dever específico de organizar e manter os serviços oficiais de estatística e geografia de alcance nacional".

O ministro não está mentindo, mas, infelizmente, Bolsonaro pode tomar decisões equivocadas e absurdas como não realizar o Censo. Aliás, o governo de Bolsonaro é uma coletânea de absurdos. Mas admitir tamanha intromissão no Executivo gera mais um precedente perigoso para as administrações futuras e embaralha ainda as atribuições dos Três Poderes. Não é saudável para a já combalida e bagunçada democracia brasileira.