Topo

Leonardo Sakamoto

Sem auxílio emergencial, nem Renda Brasil, popularidade de Bolsonaro murcha

Colunista do UOL

16/09/2020 05h12

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Ao afirmar, nesta terça (15), que seus subordinados estão proibidos de falar sobre "Renda Brasil", Jair Bolsonaro deu início a uma contagem regressiva contra si mesmo. A partir de Primeiro de Janeiro, não haverá mais pagamento do auxílio emergencial, nem programa similar para ficar no lugar. Com isso, a tendência é que o aumento de popularidade que experimentou na pandemia comece a derreter e a aprovação volte à da época em que "impeachment" era palavra corriqueira.

Para quem não acompanhou a história, o presidente deu um esporro público em sua equipe econômica através de um vídeo nas redes sociais. Reclamou de estudos que previam tirar de pobres para bancar o tal Renda Brasil, o Bolsa Família anabolizado que ele pretendia deixar no lugar do auxílio.

E por quê? Porque a transferência de R$ 600 por cinco meses e o impacto dela na economia são a principal razão para justificar que, mesmo com a fuga de parte da classe média de sua base de apoio, sua aprovação tenha subido de 32% para 37%, segundo o Datafolha.

Vendo que programas sociais trazem retorno de imagem, ele se lambuzou no auxílio. Perdemos a conta do número de vezes que seu governo o vendeu como o único pai da criança, deixando deputados e senadores em segundo plano.

Com a regra do teto de gastos ainda vigente, limitando o crescimento do orçamento à inflação, sua equipe tem que tirar de outra área para bancar o programa. E, convenhamos, a turma do Paulo Guedes é realmente bem criativa na insensibilidade social: estudou o fim do abono salarial para quem ganha dois salários mínimos, a desindexação de benefícios sociais do salário mínimo e o reajuste do salário mínimo pela inflação. A possível tunga em aposentadorias e pensões de idosos e pessoas com deficiência em situação de miséria foi a gota d'água.

Com vídeos, como o desta terça, Bolsonaro pratica um de seus esportes preferidos: tirar o corpo fora. Ele andou treinando bastante nos últimos meses, ao repetir, de forma enganosa, que o Supremo Tribunal Federal tirou dele a responsabilidade de tocar a política para enfrentar a covid. Agora, veio passar sabão em sua equipe mostrando que tem comando. Mas a culpa é principalmente dele, pois colocou Paulo Guedes e suas crenças para gerir a economia do país. A menos que ele achava que dava para fazer uma torta de limão usando frango.

Mirando a conquista da base lulista e a reeleição em 2022, Bolsonaro sabe que seu futuro político depende mais de um programa de transferência de renda parrudo do que do respeito às balizas fiscais e de preocupação com o endividamento.

Ironicamente, ele pode ser salvo pelo Congresso Nacional uma segunda vez.

No início do ano, ganhou um presentão quando deputados e senadores rejeitaram sua proposta original de um auxílio emergencial de 200 mangos. Com o aviso do fim do Renda Brasil (por mais que seja difícil imaginar que ele não vá tentar anabolizar o Bolsa Família ou criar outra coisa), parlamentares começaram a discutir projetos de renda básica que tramitam nas duas casas.

Ou seja, da mesma forma que deixou o trabalho pesado para prefeitos e governadores na pandemia, enquanto se divertia passeando de jet ski, promovendo aglomerações antidemocráticas e xingando jornalista, ele pode deixar o quebra-cabeça da fonte de recursos para ser resolvido pelo parlamento.

Depois, é só aparecer no final, propor uma leve alteração no projeto, tipo subir em R$ 100 o valor, sequestrar a sua paternidade e fazer um monte de lives chamando para si os votos, quer dizer, os méritos.

Por outro lado, caso nada de novo apareça até Primeiro de Janeiro, podemos presenciar sua popularidade, inflada artificialmente, perder o gás se a transferência de renda voltar ao escopo do Bolsa Família (R$ 190 em média e 14,2 milhões de famílias).

Talvez seja possível presenciar algumas mudanças em sua aprovação já nos próximos meses, considerando que a Medida Provisória que prorrogou o auxílio emergencial até o final do ano também o reduziu de R$ 600 para R$ 300. O que causará impacto na nossa debilitada economia se o Congresso não mudar isso também.

Há uma massa de pessoas pobres que não gosta dele, mas que é pragmática a ponto de saber que não faz sentido mudar uma situação que lhe é benéfica - ainda mais em um país que é craque em lhe dar as costas. Agora, se até o benefício desaparecer e ficar apenas a imagem de um sujeito grosseiro e que parece mais atrapalhar do que ajudar, apoiá-lo pra quê?