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Leonardo Sakamoto

Cuecagate: Um Senado que não se limpa merece continuar existindo?

25.ago.2020 - Presidente Jair Bolsonaro (sem partido) abraça o senador e vice-líder do governo Chico Rodrigues durante evento no Palácio do Planalto - Reprodução/Twitter
25.ago.2020 - Presidente Jair Bolsonaro (sem partido) abraça o senador e vice-líder do governo Chico Rodrigues durante evento no Palácio do Planalto Imagem: Reprodução/Twitter

Colunista do UOL

24/10/2020 19h10

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Após ser flagrado pela Polícia Federal com quase 15 salários mínimos entre as nádegas, o senador Chico Rodrigues (DEM-RR) pediu licença de 121 dias. Com isso, assumirá em seu lugar o suplente, seu filho, Pedro.

Seus colegas senadores articularam a solução para evitar que o plenário do Supremo Tribunal Federal analisasse o seu afastamento. Não por amor a Chico, mas por autopreservação. Aumenta, assim, a chance de tudo ser esquecido, soterrado pelo próximo escândalo.

O Senado Federal é parte fundamental de nosso sistema político desde o Império. Mas parece fazer questão de fornecer argumentos àqueles (entre os quais, não me incluo) que defendem o seu fim em nome da redução de custos.

A discussão sobre a necessidade de o Congresso Nacional ser bicameral, com uma Câmara dos Deputados (que representa os cidadãos) e um Senado (que representa os Estados e o Distrito Federal), não é de hoje.

Há os que advogam pela extinção desta segunda casa, sob a justificativa de que, com exceção de atividades específicas que poderiam ser transferidas (como sabatinar e ratificar a nomeação de embaixadores e de indicados ao STF), ela tem atuado apenas como uma plataforma para políticos que já governaram ou pretendem governar seus Estados de origem.

Outro argumento que pesa é que o Senado estaria abrindo mão de seu papel de câmara revisora, agindo como um puxadinho da Câmara ou do Palácio do Planalto.

Por exemplo, em 2017, para evitar que mudanças no Senado levassem a Reforma Trabalhista de novo à Câmara, um acordo foi firmado entre senadores da base aliada e o governo Michel Temer - que prometeu a edição de uma Medida Provisória com um grupo de alterações que os senadores gostariam de ver no projeto.

Os senadores da base se deram por satisfeitos e aprovaram a reforma. A MP foi editada, mas caducou na Câmara. Em outras palavras, interpretaram o papel de paga-lanche.

O Senado é maior do que isso. Quer dizer, deveria ser.

Como já escrevi aqui, é paradigmático que Chico Rodrigues, um vice-líder do governo, flagrado com maços de dinheiro escondidos entre suas nádegas durante uma operação da Polícia Federal que investigava desvios de recursos que deveriam ir para o combate à covid, seja membro titular do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar do Senado.

Não que o colegiado faça jus ao nome. Tanto que se movimentou rapidamente em nome de uma operação-abafa a fim de evitar a suspensão.

Aqui não se defende uma expulsão sumária do senador, mas que seus colegas sejam céleres em cobrar explicações e entregá-las à sociedade. Explicações melhores do que aquelas que ele deu em seu pedido de afastamento: "Em um ato impulsivo, acordado pela Polícia, de pijama, assustado com a presença de estranhos em meu quarto, tive a infelicidade de tomar a decisão mais irracional de toda a minha vida".

Mas em um momento em que o próprio líder da nação é acusado de usar a estrutura de inteligência do Estado na defesa de seu filho, um senador, envolvido em um caso de desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro, a proteção dada pelo Senado a Chico Rodrigues é apenas um detalhe no novo normal da República.