Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
'Toque de restrição' de Doria será pouco efetivo contra mortes por covid
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O governo de São Paulo anunciou, nesta quarta (24), que aumentará fiscalização e multas para restringir a circulação de pessoas, das 23h às 5h, entre os dias 26 de fevereiro e 14 de março, a fim de evitar aglomerações e festas e reduzir a transmissão do coronavírus. O governador João Doria (PSDB) chamou a medida de "toque de restrição", afirmando que não representa um "toque de recolher", nem um bloqueio completo, o chamado "lockdown".
Tomada em meio ao aumento no número de internações por covid-19, a decisão foi considerada branda e pouco efetiva por especialistas ouvidos pela coluna.
"É para inglês ver - e para a variante inglesa da covid, e as demais variantes, verem e pouco se importarem também", afirmou a doutora em microbiologia e diretora do Instituto Questão de Ciência Natália Pasternak.
Para ela, é estranho implementar a restrição da mobilidade em um momento do dia em que ela já é reduzida. "Parece que realmente falta coragem para implementar medidas que sejam de fato restritivas e tenham impacto na transmissão", diz Pasternak.
O infectologista Marcos Boulos, ex-diretor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e integrante do Centro de Contingência do Coronavírus do Estado de São Paulo, também considera o anúncio como insuficiente.
"O Centro de Contingência tem reiteradamente dito que está ficando insuportável o número casos de covid que pedem UTI e sugerido ao governador ações mais rígidas. Cidades estão indo ao caos e pacientes morrendo", alerta.
Lockdown reduziria mortes e facilitaria a retomada da economia, diz Boulos
"A situação é mais alarmante que no ano passado. Parece que as recomendações à população [de distanciamento social] não estão mais sendo levadas a sério." Ele defende que o toque de restrição tenha horários ampliados e ocorram punições elevadas a aglomerações e festas.
Boulos pondera que não está sendo tranquilo para o governo mediar a questão sanitária com a pressão econômica de setores que defendem a liberação de atividades diante da possibilidade de falências e demissões.
Mas defende um fechamento como os que ocorreram na Inglaterra e em Portugal, isolando a população por algum tempo. Para ele, isso fará com que, em algumas semanas, voltemos a uma vida (quase) normal. Alerta que, se ficarmos nesta situação, a pandemia acabará se arrastando por mais tempo, o que prejudicará mais ainda a economia.
Para que isso ocorresse, seria necessário que o governo federal já tivesse renovado o pagamento do auxílio emergencial a fim de garantir alguma dignidade a famílias de trabalhadores informais.
Contudo, a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) Emergencial para estender o auxílio foi usada como Cavalo de Troia para um ajuste fiscal, com medidas alienígenas como o fim da obrigatoriedade dos gastos mínimos em educação e saúde. Contrariados com a manobra do governo Jair Bolsonaro (sem partido), parlamentares não devem aceitar o texto, o que fará com que o benefício atrase ainda mais.
Enquanto isso, São Paulo vai piorando.
"A situação é muito ruim nos hospitais privados, mas os hospitais públicos estão piorando rapidamente", avalia André Nathan, pneumologista do Hospital Sírio-Libanês e professor do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
"Se não houver ações por parte da população, com isolamento e uso de máscara, e medidas restritivas sérias por parte do governo, além da criação de leitos de UTI, podemos ter um colapso", avalia.