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Leonardo Sakamoto

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Gastos com férias de Jair bancariam auxílio de R$ 600 a 3,8 mil brasileiros

Cruzes no cemitério Parque Taruma em Manaus durante a pandemia da covid-19 - Bruno Kelly/Reuters
Cruzes no cemitério Parque Taruma em Manaus durante a pandemia da covid-19 Imagem: Bruno Kelly/Reuters

Colunista do UOL

02/04/2021 21h20

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Com os mais de R$ 2,3 milhões de grana pública usados pelo presidente da República para curtir férias em São Francisco do Sul (SC) e no Guarujá (SP) daria para ter bancado auxílio emergencial de R$ 600 a, pelo menos, 3,8 mil brasileiros por um mês. Ou distribuído mais de 800 mil máscaras PFF2 em ônibus e trens.

Em ambos os casos, menos trabalhadores iriam se contaminar, seja por não precisarem sair do isolamento social para matar a fome de seus filhos (vale lembrar que o benefício só voltará a ser pago na próxima terça, após 96 dias de paralisação), seja por reduzir o risco de contágio no transporte público lotado. E, dessa forma, vidas teriam sido salvas.

Contudo, ocorreu exatamente o oposto. Durante as viagens pagas com nosso dinheiro, realizadas entre 18 de dezembro e 5 de janeiro, Jair Bolsonaro promoveu aglomerações nas praias por onde passou, colaborando para mais mortes semanas depois.

Diferentemente de alguns nomes reluzentes do governo e do empresariado, considero sagrado e intocável o artigo 7º, inciso XVII da Constituição Federal, que prevê as férias anuais remuneradas. Nada contra portanto, o descanso do presidente - apesar da impressão de que ele vive o tempo todo de férias.

Mas é vexatório que, no momento em que o número de casos por covid-19 escalava, apontando para uma segunda onda que se revelaria um tsunami de mortos, ele tenha gasto recursos públicos de forma tão desnecessária. Viagem de chefe de Estado demanda segurança e segurança custa dinheiro? Que ficasse no Palácio do Alvorada alimentando as emas com cloroquina.

O cálculo de R$ 2,3 milhões foi enviado pelo Gabinete de Segurança Institucional após pedido de informação do deputado federal Elias Vaz (PSB-GO). Diz respeito ao transporte aéreo, diárias, hospedagem, entre outros custos, e inclui a equipe de apoio.

Claro que esse valor comparado aos bilhões que o Brasil precisa para pagar auxílio emergencial, comprar vacinas, ativar leitos de UTI covid, fornecer oxigênio hospitalar, adquirir insumos para intubação de doentes é muito pouco. Poderia até soar demagogia, se não estivéssemos em uma tragédia.

Ele é o presidente da República. E evitar esse gasto demonstraria que sente empatia pelo povo que está lutando para sobreviver em meio ao caos. Ou, ao mesmo, empatia pelas contas públicas, que estão sob estresse.

Ao tirar férias espalhafatosas e que promoveram aglomeração, Bolsonaro quis vender a ideia de que tudo estava normal e que os brasileiros não deveriam ter medo de ir às ruas.

Em outras palavras, usou dinheiro público para sabotar o isolamento social, única medida eficaz contra a pandemia, uma vez que não temos vacinas o suficiente neste momento por sua omissão deliberada no ano passado.

Quem acha que esses recursos serão um dia devolvidos, esqueça. O Ministério Público do Rio de Janeiro tenta, a duras penas, responsabilizar a sua família por desvios de salários de servidores de seus gabinetes. Se é difícil reaver as "rachadinhas", imagina então conseguir de volta um mimo que é permitido por lei...