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Leonardo Sakamoto

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Petrobras: Mercado que foi tigrão com Dilma será tchutchuca com Bolsonaro?

REUTERS/Ueslei Marcelino
Imagem: REUTERS/Ueslei Marcelino

Colunista do UOL

24/05/2022 06h54

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Setores do mercado que rangem os dentes ao tratar da política de contenção nos preços dos combustíveis durante o mandato da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) vão também xingar a mão peluda do presidente Jair Bolsonaro (PL) - que troca presidente da Petrobras com mais frequência que time em crise no início de Brasileirão troca de técnico - ou assumirão que há uma questão de preferência ideológica?

O governo anunciou a saída de José Mauro Ferreira, que nem tinha aprendido ainda a estacionar o carro na sede da empresa na avenida República do Chile, no Rio, indicando Caio Paes de Andrade, sem a experiência exigida para o cargo, para o seu lugar.

Foi a quarta troca desde que Jair trouxe pão com leite condensado ao cardápio do lanchinho do Palácio do Planalto. A mudança ocorre após a entrada de Adolfo Sachsida no Ministério das Minas Energia (o almirante Bento Albuquerque foi lançado ao mar) com a tarefa de evitar que o preço dos combustíveis ajude a derrotar o "mito" em sua gloriosa cruzada rumo à reeleição. Quem diria que o ultraliberalismo serviria, mais uma vez, como garçom de político autoritário na América do Sul, né mesmo?

A tática de Bolsonaro de enfrentamento de problemas nacionais, como o impacto do preço dos combustíveis na inflação, não envolve diálogos com o Congresso Nacional e setores da economia, incluindo patrões e trabalhadores, para a construção de soluções. A tática de Bolsonaro é a guerra. Ele age na tentativa de desmoralizar publicamente aquilo que é visto por ele como entrave, seja para esconder a sua inoperância, seja para maquiar ações impopulares tomadas por sua equipe.

Uma parte do mercado, alinhada ideologicamente com o presidente, prefere perder um cascalho agora, com a Petrobras segurando os preços de uma forma atabalhoada até a reeleição, e evitar que o PT volte ao poder - Lula já indicou que não vai manter a política de preços da empresa se eleito. Esse silêncio fala alto, sendo a versão farialimer do "eu tenho medo", popularizado pela atriz que interpretou a Viúva Porcina.

Ou seja, não se importam com a instrumentalização da empresa, porque têm certeza que, no dia seguinte à sua eleição, Jair volta atrás, liberando um grande aumento de preços. Sabem que, no fundo, ele não se preocupa com o populacho que compra verduras na feira encarecidas pelo transporte, nem com caminhoneiros que se esfolam para pagar o diesel, nem com entregadores de comida que se arriscam descendo ladeiras na banguela para economizar gasosa. Preocupa-se com sua permanência no poder.

Não é coincidência a liberdade com a qual Jair mexe em estatais e ataca instituições, como o STF e o TSE. A raiz é a mesma.

Bolsonaro já afirmou que não quer mais ser culpado pela alta nos preços e, por isso, adoraria vender a Petrobras. "Aumentou a gasolina? Culpa do Bolsonaro! Eu já tenho vontade de privatizar a Petrobras, tenho vontade. Vou ver com a equipe econômica o que a gente pode fazer. Eu não posso, não é controlar, mas melhor direcionar o preço de combustível. Mas quando aumenta, a culpa é minha", afirmou em 14 de outubro do ano passado.

Pesquisa Ipespe deste mês mostra que a população aponta Petrobras e Jair como os principais culpados pelo aumento no preço dos combustíveis. Perguntados sobre quem tem "muita responsabilidade" pelo aumento dos combustíveis, 64% indicam a empresa e 45%, o presidente.

O novo ministro de Minas e Energia pautou o assunto. A venda não tem chance de avançar neste mandato - seja pela oposição da opinião pública, pela oposição do Congresso inclusive de parte da base do governo e pelo longo tempo que o processo tomaria. Mas, em um segundo, tudo é possível, até a democracia virar pó.

Os ultraliberais acharam que Bolsonaro seria o Pinochet certo na hora certa e colocaria a agenda deles em primeiro lugar. Da mesma forma, lavajatistas chegaram à loucura de vender o patriarca da "rachadinha" como um lutador contra a corrupção nas eleições de 2018. Sergio Moro, que ajudou a elegê-lo e depois assumiu o Ministério da Justiça, que o diga.

Bolsonaro vai se refestelar no populismo daqui até outubro de 2022. Vai ser divertido ver o contorcionismo que a "equipe técnica" do governo vai dar para justificar tudo isso. E ver o que uma parte do mercado continuará dizendo para apoiar o capitão. Insistirá em passar pano para as ações dele ou optará pela sinceridade do "pelo menos não é o PT"?