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Leonardo Sakamoto

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

'Vai pra trás!' Bolsonaro demonstra por que tem menos votos entre mulheres

25.jun.2022 - O presidente Jair Bolsonaro (PL) ordenou à  vice-governadora de Santa Catarina, Daniela Cristina Reinehr, em agenda pública realizada ontem na praia de Balneário Camboriú, que ficasse para trás - Reprodução
25.jun.2022 - O presidente Jair Bolsonaro (PL) ordenou à vice-governadora de Santa Catarina, Daniela Cristina Reinehr, em agenda pública realizada ontem na praia de Balneário Camboriú, que ficasse para trás Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

26/06/2022 15h14

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Um episódio ocorrido na praia de Balneário Camboriú (SC), neste sábado (25), ajuda a explicar a razão de Jair Bolsonaro ter apenas 21% de intenção de votos entre as mulheres, segundo o Datafolha.

Ele saudava apoiadores ao lado do empresário bolsonarista Luciano Hang, produzindo imagens para a sua campanha, quando virou para onde estavam aliados, como a vice-governadora de Santa Catarina, Daniela Reinehr, e, irritado, ordenou: "Vai pra trás! Meu Deus do céu!" Com isso, ela saiu de perto do grupo. Reinehr é apoiadora do presidente e do mesmo partido que ele, o PL. Após a polêmica, ela fez coro com outros apoiadores do presidente de que a reclamação se dirigia ao ex-secretário de Aquicultura e Pesca, Jorge Seif, e não a ela.

A forma ríspida com que ele deu o recado junto com o conteúdo excludente fez com que a hashtag "Bolsonaro odeia mulheres" se tornasse um dos assuntos mais comentados do Twitter neste domingo.

Entre as mulheres, o ex-presidente Lula tem 49% das intenções de voto e o ex-governador Ciro Gomes (PDT), 9%. Entre os homens, Bolsonaro aponta 36%, Lula, 44% e Ciro, 8%. No total, Lula venceria no primeiro turno, alcançando 47% e todos os demais, 41% - dos quais Bolsonaro contaria com 28%.

Apoiadores do presidente têm defendido que a primeira-dama, Michelle Bolsonaro, ajude a melhorar a imagem do marido, principalmente entre os evangélicos. A questão é que, para tanto, ela teria que operar um milagre, considerando que o presidente continua dando provas de seu machismo. Até com suas apoiadoras.

Há uma parcela das mulheres que reprova Bolsonaro por seu comportamento historicamente misógino e violento. Quando parlamentar, ele afirmou, por exemplo, à deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) que ela não "merecia" ser estuprada por ele. Também disse que teve uma filha mulher porque deu uma "fraquejada".

Isso não mudou quando assumiu o governo, pelo contrário. Sua visão sobre elas pode ser resumida em uma frase do discurso que proferiu, no último 8 de março, em celebração do Dia Internacional da Mulher. Nele, o presidente afirmou que "as mulheres estão praticamente integradas à sociedade" - mostrando, dessa forma, que é ele quem não está.

Também escolheu as mulheres jornalistas como alvo preferencial para seus ataques à liberdade de imprensa. Profissionais como Patrícia Campos Mello, Miriam Leitão e Vera Magalhães sofreram com declarações do presidente que serviram de ordem de ataque para assédio violento por parte de seu rebanho.

Além disso, sua política de liberação de armas tem efeito negativo junto ao público feminino, apesar de conseguir bons resultados junto a homens inseguros. E seu negacionismo na pandemia de covid-19, que ajudou o país a atingir 670 mil mortes, também é repudiado mais por mulheres do que homens.

Por fim, os impactos da crise econômica se fazem sentir mais entre as mulheres (principalmente as negras) do que entre os homens, de acordo com a Síntese dos Indicadores Sociais do IBGE. Contudo, agora ele administra um país com uma inflação anual de 12,04%, uma queda de 9,34% no rendimento médio dos trabalhadores desde janeiro de 2020 e um botijão de gás que passa de R$ 150 em muitos lugares.

Não apenas porque elas foram atingidas em cheio pelo desemprego e pela queda de renda, mas também porque muitas delas são as responsáveis pelo bem-estar de suas famílias. É a crise econômica, que joga 33 milhões de pessoas para a fome, e não questões comportamentais e culturais que tira o sono de dezenas de milhões de mulheres diariamente.

Em 4 de fevereiro, Bolsonaro soltou uma ironia para os seus fãs na porta do Palácio do Alvorada, afirmando que "segundo pesquisa, as mulheres não votam em mim" - reforçando a desconfiança que sempre jogou sobre levantamentos de opinião que lhe são desfavoráveis.

Mulheres votam sim em Bolsonaro, mas elas, segundo o Datafolha, são menos da metade das que escolhem Lula. Até porque, se ele trata dessa forma aliadas, imagina então o que seria capaz de fazer com as que ele não conhece, mas dependem dele para garantirem alguma dignidade?