Leonardo Sakamoto

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Opinião

Apocalipse deixa paulistano com ar podre no inverno e no escuro no verão

Quais são as atrações da maior cidade do país? No inverno, um ar podre e irrespirável, fruto da grave seca na Amazônia e dos incêndios criminosos no interior do estado. Já no verão, temos os apagões de energia elétrica, resultados de tempestades também bombadas pelas mudanças climáticas junto com a incompetência da concessionária de energia elétrica e do poder público.

Na manhã desta segunda (9), São Paulo registrava a pior qualidade de ar no mundo em comparação a outras cidades, segundo o site suíço IQAir. Ho Chi Minh, no Vietnã, Lahore, no Paquistão, Jerusalém, em Israel, Doha, no Qatar, e Pequim, na China, completavam os primeiros lugares no triste ranking. Nossa cidade está seca, quente e poluída.

Quem é de fora e pode trocar a data da viagem, não venha para cá neste momento. Dor de cabeça, tontura, enjoo, irritação nos olhos, sem contar os problemas respiratórios te esperam. Prontos-socorros estão apinhados de crianças e idosos em busca de nebulização. O ar está um nojo. O humor médio, péssimo. Se a viagem for imprescindível por causa do trabalho, contente-se em saber que esta catástrofe também é fruto de negócios.

Nós, paulistas, dependemos da Amazônia para sobreviver. Na América do Sul, na África e na Austrália, o Trópico de Capricórnio corta desertos. Por aqui, graças à umidade que vem da nossa maior floresta, bate na Cordilheira do Andes e desce para o Sudeste e o Sul é que temos vida. Quando a Amazônia vive uma forte seca, São Paulo se lasca junto. Seja nas mãos de fazendeiros criminosos, seja por acidente, o fogo encontra por aqui um ambiente propício para se alastrar.

Se a floresta for para o saco, os paulistas vão também. Simples assim. Tchau, tchau agropecuária e indústrias.

Isso no inverno. No verão, todos os anos, deslizamentos e inundações, costumam ceifar com lama vidas pobres que moram nas periferias. Entre o final do ano passado e o começo deste, tivemos tempestades que causaram apagões, como o que manteve 1,5 milhão de moradores no escuro mais de 24 horas após a chuva.

Moradores de regiões protegidas, que nunca precisarão se preocupar se o seu barraco está em área de risco, sentiram seu cotidiano mudar com a falta de luz pois não podia recarregar o celular. Ao mesmo tempo, empresas e consumidores perderam produtos e geladeiras, médicos e pacientes sofrem com a falta de luz e de geradores decentes e crimes foram cometidos com as ruas mais escuras.

A tempestade encontrou cidades com milhares de árvores sem a devida manutenção, com raízes fragilizadas ou comidas por cupins. Tudo isso com a Enel, concessionária de serviços públicos, operando despreparada, como se o clima não tivesse mudado. Ventos acima de 80 km/h podem derrubar árvores, mas São Paulo padeceu pela incompetência e o despreparo.

Responsabilizar o poder público e o setor privado é parte importante da questão, mas não a esgota. Esquentamos a temperatura média do planeta, aumentando a frequência de eventos climáticos extremos. Precisamos preparar São Paulo para essa nova realidade, cuidando principalmente de quem pode perder a vida. Mas também atuar sobre a responsabilidade a cidade, e, portanto, nossa, para o aquecimento do planeta.

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Por exemplo, parte da madeira extraída da Amazônia vem para a construção civil do estado e somos grandes consumidores da carne bovina e de matérias-primas produzidas por lá, como minérios e soja. Atividades conectadas com desmatamento e queimadas. Sem contar que hidrelétricas são construídas, impactando o clima, para nos abastecer de energia.

Ao mesmo tempo, milhões de escapamentos de nossos carros, motos e caminhões pioram o efeito estufa, enquanto o aumento da malha de transporte de massa sobre trilhos segue devagar quase parando. E temos uma cobertura vegetal pequena e malcuidada em comparação ao nosso tamanho. São Paulo é vítima do clima, mas também seu algoz.

Matamos o inverno e o verão. Temos, na maioria do tempo, calor com seca ou com chuva. Como já disse aqui, essa deveria ser a principal pauta da eleição municipal, a adaptação de São Paulo e a mitigação do impacto climático.

Mas, para uma parte do eleitorado, parece mais importante que os candidatos prometam combater o terrorismo do Hamas ou a autocracia de Nicolás Maduro. A realidade que queima, inunda e mata? Não importa. As pessoas querem se divertir nas redes sociais. A realidade só se imporá quando não houver energia elétrica para carregar o smartphone.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL