Leonardo Sakamoto

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Opinião

Milícia de GCMs rouba açougues enquanto mata-se pobre por furtar carne

O destino de quem furta carne no Brasil depende sempre de ter ou não os amigos certos.

O secretário de Segurança Urbana de Ribeirão Pires, Sandro Torres Amante, foi condenado a quase três anos de prisão pelo Tribunal de Justiça de São Paulo por ter furtado 60 kg de carne e R$ 28 mil em dinheiro de dois açougues — tudo registrado com câmeras de segurança. Isso teria acontecido para vender proteção na época em que ele era subcomandante da Guarda Civil Metropolitana (GCM), e ele também foi denunciado por integrar uma milícia que extorquia comerciantes locais. Amante alega inocência e vai recorrer.

Mesmo respondendo na Justiça pelo caso, ele foi nomeado secretário pelo prefeito Guto Volpi (PL), reeleito no ano passado, que disse acreditar que o assessor é inocente. O TJSP determinou a perda do cargo. Volpi ficou conhecido nacionalmente ao nomear o pai como secretário de Saúde, o irmão, secretário da Educação, e a mãe, presidente do Fundo Social de Solidariedade. Seu pai, Clóvis, também do PL, já havia sido prefeito e foi cassado pela Justiça Eleitoral.

A milícia de Amante teria agido entre 2019 e 2023. Considerando esse recorte de tempo, trago dois casos.

Em outubro de 2022, dois homens foram torturados e extorquidos por cinco seguranças do UniSuper, em Canoas (RS), diante do gerente e do subgerente da loja, após tentarem furtar duas peças de carne. Vítima das piores agressões, um homem negro teve que ser colocado em coma induzido no hospital com fraturas no rosto e na cabeça. Após o espancamento, o gerente ainda tirou uma foto para comemorar.

E, em abril de 2021, Bruno Barros e Yan Barros, tio e sobrinho, que furtaram quatro pacotes de carne de uma unidade do Atakarejo, em Salvador, foram encontrados mortos com sinais de tortura e marcas de tiro em abril de 2021. Seguranças do mercado os entregaram a traficantes para que fossem punidos.

É interessante como o "bandido bom é bandido morto" vale para a ralé. Na época em que esses casos ocorreram, os comentários nas redes celebravam as mortes e pediam mais. Quando se trata de pessoas acusadas de formarem milícias, a coisa muda de figura, surgindo reclamações de que a condenação é injusta, pois eles fariam um bem à sociedade, limpando as ruas de "vagabundos".

O apoio a milicianos é típico de uma sociedade doente que, cansada de impunidade, resolveu trocar o senso de Justiça pelo apoio ao justiçamento. Mesmo que os justiceiros sejam tão ou mais bandidos quanto os bandidos que dizem querer combater.

Não à toa o policial militar Vinicius de Lima Britto foi tratado como herói por algumas pessoas após matar Gabriel da Silva Soares, que roubou pacotes de Omo líquido em uma unidade do Oxxo, em São Paulo, com 11 disparos nas costas.

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Como falta amor no mundo, mas também falta interpretação de texto, esta coluna não defende que ninguém seja executado, bandidos, milicianos ou sonegadores, mas deseja que a Justiça alcance a todos de forma igual. Desejo cuja hipótese de se concretizar é semelhante ao tal camelo passar pelo buraco da tal agulha.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL