Com PM que mata e vala de rivais, PT-BA age como bolsonaristas que critica
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Certas declarações já seriam profundamente constrangedoras se proferidas por um cidadão comum, como a sugestão de que eleitores de Bolsonaro devem ser enterrados em uma vala. Mas quando se trata do governador do estado com a maior letalidade policial do país, o negócio ganha tons bizarros. Tão bizarro quanto o fato de que há pouca diferença entre a fala de um governador petista e a conclamação para "fuzilar a petralhada" eternizada por Jair.
"Tivemos um presidente que sorria daqueles que estavam na pandemia sentindo falta de ar. Ele vai pagar essa conta dele e quem votou nele podia pagar também a conta. Fazia no pacote. Bota uma 'enchedeira'. Sabe o que é uma 'enchedeira'? Uma retroescavadeira. Bota e leva tudo para vala", afirmou o petista Jerônimo Rodrigues, na última sexta, no interior da Bahia.
Após a óbvia repercussão negativa, ele se disse religioso, reclamou de a fala ter sido descontextualizada e se desculpou não se desculpando com um "se o termo vala e o termo trator foi pejorativo ou foi muito forte, eu peço desculpa". Se?
Ironicamente, a Bahia é o sonho de muitos bolsonaristas que acreditam na letalidade policial como razão de existência de um Estado. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2024, produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, um em cada quatro mortes por intervenção de agentes de segurança no país ocorreu na Bahia. Ou seja, 25% dos óbitos, mas apenas 7% da população.
Líderes políticos, sociais ou religiosos afirmam que nunca incitam a violência direta através de suas palavras. Suas mãos não seguram a faca ou o revólver, mas é a sobreposição de seus argumentos e a escolha que fazem das palavras ao longo do tempo que distorcem a visão de mundo de seus seguidores e tornam o ato de esfaquear e atirar banal. Ou, melhor dizendo, "necessário".
Suas ações e regras redefinem, lentamente, o que é ética e esteticamente aceitável, visão que depois será consumida e praticada por terceiros. Estes acreditarão estarem fazendo o certo, quase em uma missão civilizatória ou divina.
Vivemos em um país que presenciou, recentemente, a morte de Marielle Franco, a tentativa de assassinato de Bolsonaro e tiros contra a caravana de Lula em 2018. Brasileiros mataram brasileiros por discussão eleitoral, em 2022, como o bolsonarista Jorge Guaranho que invadiu a festa de aniversário do petista Marcelo Arruda e o executou em Foz do Iguaçu.
Qualquer marmota que estuda ultrapolarização sabe que um dos mecanismos mais eficazes de reduzir a violência é seguidores verem seus líderes escolherem melhor as palavras para se referir a seus adversários. E Jerônimo Rodrigues foi na contramão disso.
O ex-presidente, com toda a razão, reclamou que esse tipo de discurso, vindo de uma autoridade pública, normaliza a violência política e física contra quem pensa diferente. Mas qualquer semovente sabe que Bolsonaro tem pós-doutorado em declarações do naipe da proferida por Rodrigues. Ou seja, o petista, ainda por cima, deu a ele um presentão, colocando-o no papel de vítima.
Às vezes, é difícil diferenciar políticos. Se depender de suas declarações, fica mais ainda.