Quem lucra com moto por app? Regras para frear abusos têm trajeto difícil

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Que condições teriam que ser cumpridas para a regulamentacão do serviço de aplicativo de transporte por moto em São Paulo? Seria possível aprovar regras que garantam qualidade de vida ao motorista, segurança ao usuário e aos demais cidadãos e que não onere o já sobrecarregado sistema de saúde com os feridos que virão como consequência da atividade?
Nesta sexta (16), a 7ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo voltou a proibir que a Uber e a 99 ofereçam o serviço, em mais um capítulo da guerra entre plataformas digitais bilionárias controladas por capital estrangeiro e o poder público brasileiro.
A Prefeitura de São Paulo afirma que liberar o serviço vai ampliar o número de mortos no trânsito, já as empresas alegam que isso trará mais renda a trabalhadores e comodidade à população.
Vejam que não usei o termo "mototáxi" porque essa disputa não trata disso. Mototaxistas poderiam operar amparados em lei federal. O que as empresas fazem é serviço de transporte por aplicativo que, segundo a lei federal que regulamenta a Política Nacional de Mobilidade Urbana, está autorizado só para carros.
O artigo 11-B da lei federal acima citada autoriza só apps de transporte de passageiros na categoria B (carros). Já para táxis, não faz distinção entre motos e automóveis, mas garante que as prefeituras regulamentem e determinem, inclusive, o preço das corridas.
A decisão judicial desta sexta recomendou (não determinou) que a Prefeitura de São Paulo regulamente esse tipo de transporte no prazo de 90 dias. Um grupo de trabalho vai discutir a questão, que também está passando por debates na Câmara dos Vereadores.
Conversei com gente tanto na administração quanto no legislativo municipal para saber quais seriam os critérios mínimos para o serviço de aplicativo de transporte por moto operar em São Paulo.
Na avaliação dos que a coluna ouviu, o ponto de partida seriam as condições mínimas previstas na lei federal 12.009/2009, que trata de transporte de passageiros. Ou seja, ter mais de 21 anos, possuir habilitação há pelo menos dois, ser aprovado em curso especializado, estar vestido com colete de segurança, ter proteções especiais na motocicleta, como antena para cortar linhas com cerol, entre outros.
Isso sem contar capacete dentro de acordo com as leis de trânsito para o condutor e o passageiro.
Mas também seria necessário tocar questões relacionadas ao trabalho por aplicativo. E aí, surgem outras propostas de critérios:
1) Preço mínimo por corrida pago ao trabalhador que não seja uma miséria; 2) Preço mínimo por quilômetro rodado que também não seja uma miséria; 3) Seguro obrigatório para o motorista, o passageiro e terceiros pago pela plataforma; 4) Velocidade máxima de trânsito com passageiro controlada pela plataforma; 5) Restrição da atividade às periferias, conectando-se aos terminais de ônibus; 6) Recolhimento pela plataforma de INSS ou de impostos de MEI do motorista para garantir apoio aos trabalhadores acidentados.
Até porque o objetivo seria melhorar a malha de transporte aos usuários e melhorar a vida dos trabalhadores, e não apenas enriquecer empresas, correto?
Claro que se o transporte público de ônibus, metrô e trens fosse melhor e mais barato, os cidadãos não recorreriam tanto a outros serviços. Faz-se urgente, em São Paulo, não apenas a revisão sobre a remuneração das empresas como também uma rediscussão sobre o preço e a estrutura do transporte coletivo na capital.
Mas a questão deixou de ser, há muito tempo, apenas de transporte público, como já disse aqui. É sobre a percepção de que, independente de quanto dinheiro tenha na conta ou quão grande seja, empresas não podem impor sua vontade, ainda mais vendendo-a como vontade de cidadãos pobres. Precisa obedecer as leis. Principalmente, quando elas dizem respeito a salvar vidas e garantir qualidade de vida aos trabalhadores.
A questão é se as plataformas vão aceitar todas as condições para regulamentação que garantam isso. Vale lembrar que plataformas digitais foram à guerra contra a regulação das redes sociais e de aplicativos de mensagens, vencendo uma importante batalha no Congresso Nacional com a ajuda da extrema direita. Evitar que empresas priorizem lucro sobre vidas e trabalhadores no transporte de São Paulo é mais um desafio.