Papa Leão 14 lembra da morte em Gaza quando o mundo parece que a esqueceu

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"Em Gaza, as crianças, as famílias e os idosos sobreviventes estão reduzidos à fome." Na missa que marca o início de seu pontificado, neste domingo (18), Leão 14 fez questão de lembrar aos 150 mil presentes na Praça São Pedro algo que o mundo parece que vem esquecendo: que há uma tragédia sem precedentes em curso na Palestina.
Ele também lembrou da violência em Mianmar, que "ceifou a vida de jovens inocentes", e da Ucrânia, quando afirmou que "aguarda negociações para uma paz justa e duradoura". Sobre Gaza, contudo, ele foi no ponto.
Um papa tem três funções principais: a pastoral, de conduzir o rebanho de 1,4 bilhão de católicos; a de chefe do Estado do Vaticano, com todas as suas questões estruturais, da corrupção no Banco Vaticano aos casos globais de pedofilia; e a diplomática, que diz respeito à relação com outros países e igrejas.
Neste último, se insere a declaração de Roberto Prevost, que foi mais do que litúrgica. A fome não surgiu por conta de catástrofes climáticas, mas porque o território vive uma guerra sem precedentes. O papa lembrou disso ao usar o termo "sobreviventes", no qual os vivos carregam o peso dos dos mortos. Com isso, fez pressão política por uma solução.
A ação criminosa do governo de Israel já produziu mais de 53,3 mil mortos (outros 8,3 mil desaparecidos estariam mortos embaixo de escombros, segundo o governo do Hamas). O ocupação do território ocorreu logo após o Hamas matar 1.139 pessoas no atentado terrorista de 7 de outubro de 2023 em Israel e sequestrar mais de 200.
No momento em que cresce nos Estados Unidos, no Brasil e em outros locais do mundo pressões para que qualquer movimento pró-Palestina seja estupidamente confundido com apoio ao terrorismo do Hamas, a declaração do papa é um alento.
O governo Donald Trump, por exemplo, vem cassando vistos e prendendo ativistas por defenderem a mesma coisa que ele no Vaticano, neste domingo. O vice-presidente JD Vance ouviu o recado, uma vez que estava entre os líderes mundiais que foram celebrar a entronação de Leão 14.
E não é a primeira vez que o papa lembra de Gaza, reforçando um tema que era importante a seu antecessor, Francisco — que ligava diariamente para uma igreja católica no território para saber como estavam.
A propagação do ódio a judeus e muçulmanos é uma praga que precisa ser repudiada e combatida com rigor. Mas uma crítica a um governo não é um, ataque a um povo, tanto que parte significativa dos israelenses vai às ruas cotidianamente para chamar Benjamin Netanyahu de incompetente por causa do não retorno dos reféns nas mãos do Hamas e pedir sua cabeça pelos escândalos de corrupção.
O seu governo vem caminhando no sentido do desejo com a ala dos ultraconservadores judeus que querem uma limpeza étnica do território, com os palestinos expurgados para o Egito e a Jordânia. A partir daí, metade de Gaza pode ser transformada em assentamentos e a outra em um grande resort por Trump, como o próprio já sugeriu.
É fundamental que líderes religiosos e chefes de Estado com acesso à mídia, como o papa Leão 14, lembrem ao mundo o fato de que o povo de Gaza segue lá, sendo morto. Não se semeia a paz enterrando a verdade sob escombros. Pelo contrário, o que brota disso é guerra e genocídio.
Em tempo: "Em nossos dias, ainda vemos muita discórdia, muitas feridas causadas pelo ódio, pela violência, pelo preconceito, pelo medo da diferença e por um paradigma econômico que explora os recursos da Terra e marginaliza os mais pobres", disse também Leão 14 na missa de hoje. Mostra, dessa forma, que conhece bem a América Latina que o acolheu por décadas.