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Madeleine Lacsko

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Alexandre de Moraes expõe TSE ao aceitar rivalizar com Carlos Bolsonaro

Lula e Bolsonaro frente a frente no TSE; no destaque, Carlos Bolsonaro - Mateus Vargas/Folhapress; Reprodução; redes sociais
Lula e Bolsonaro frente a frente no TSE; no destaque, Carlos Bolsonaro Imagem: Mateus Vargas/Folhapress; Reprodução; redes sociais

Colunista do UOL

18/08/2022 11h04

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As efusivas comemorações em torno do discurso político do presidente do TSE mostram que nossa noção de democracia já foi para as cucuias mesmo.

Em um ponto Alexandre de Moraes foi perfeito, o de saciar a sede de schadenfreude da intelligentsia nacional. Schadenfreude, palavra alemã que descreve o deleite com o infortúnio de alguém, é um dos principais motores do engajamento em redes sociais.

Impossível segurar a excitação diante de um Jair Bolsonaro apalermado, ouvindo umas boas verdades na cara e sem esconder a irritação. Melhor ainda aquela foto de Carlos Bolsonaro sentado, apático, engolindo calado poucas e boas sobre urnas e "fake news".

Fosse um bate-boca do Power Couple Brasil, treta de blogueira ou rinha de galo, tudo bem. O que vale é o espetáculo.

Ocorre que era a posse do presidente da vez da corte eleitoral do país num momento delicadíssimo da nossa democracia. E ele escolheu o personalismo, a bravata, a agressividade e rivalizar com vereador, algo que apequena o TSE.

Existe uma máxima que vale para o humor e também para a política: você sobe quando bate para cima e se rebaixa quando bate para baixo. Alexandre de Moraes escolheu fazer política em vez de defender a institucionalidade em sua posse e bateu para baixo.

Pior que isso, bateu mal, um luxo que pode custar caro. O presidente do TSE prometeu combater "fake news" mas deixou claro que nem sabe do que está falando.

Ao dizer claramente que "fake news" são notícias falsas ou mentiras, evidencia que não tem condição nem de descer para o playground armado por Carlos Bolsonaro. Pior para nós todos. Vaidade é bicho que come o dono.

Diante de todos os problemas do clã Bolsonaro, o único filho adequado para levar a uma posse no TSE é Laurinha. Mas o escolhido foi justamente Carlos Bolsonaro.

O vereador está envolvido até o pescoço com o inquérito das "fake news", tocado por Alexandre de Moraes. Se a ideia era cavar uma rivalidade, o ministro mordeu a isca.

Há semanas Carlos Bolsonaro posta informações falsas espalhadas por rivais de seu pai. São imprecisões ou erros de informação, não esquemas coordenados para manipulação do debate ou contexto, o que seriam "fake news" e desinformação.

Um dos principais braços de Steve Bannon, o agora condenado Andrew Anglin, dono do Daily Stormer, colocou até em manual a técnica de expor as contradições do adversário para primeiro desacreditar e depois desumanizar.

É precisamente o que Carlos Bolsonaro anda fazendo e só dá certo porque o TSE engatou na rivalidade. A reação de quem é provocado define o sucesso da ação, também ensinava Andrew Anglin.

Há semanas o vereador posta declarações de Lula sobre o próprio pai que não conferem com a realidade. Agora também está postando decisões do TSE unicamente contra os aliados de seu pai, o que cria uma ideia de perseguição.

Mas essa falsificação de contexto só funciona porque Alexandre de Moraes escolheu a forma mais desfavorável de retratar o combate à desinformação, um "nós contra eles" entre o Poder Judiciário e os demais. É um tabuleiro feito para perder o jogo.

Combater a desinformação que ameaça a democracia exige postura magnânima e união dos Três Poderes e do aparelho de Estado. O poder do TSE está em se colocar acima das rivalizações.

Na semana passada, a diretora da Agência de Cybersegurança e Intraaestrutura do Departamento de "Homeland Security" dos Estados Unidos apresentou em Las Vegas os preparativos de combate à desinformação para as eleições de 2024.

Jen Easterly montou uma equipe técnica de primeira linha e estão focados em treinamento local e fortalecimento das comunidades contra manipulação e desinformação.

A militar estrelada, que trata desinformação como "warfare" e assunto de Estado, deixou claro que nem é função da agência derrubar postagens específicas. São acompanhadas tendências macro e operações que podem envolver dezenas de plataformas simultaneamente.

Enquanto isso, o TSE se ocupa de mandar derrubar vídeo da ministra Damares e proibir Lula de chamar Bolsonaro de genocida. Não combate "fake news" e sequer serve como demonstração de força.

Aparentemente, dar murro na mesa é o trunfo para conter as confusões que o clã Bolsonaro pode provocar a partir do mundo digital. Pena que não funciona.