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Madeleine Lacsko

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Fanáticos guerreiam e políticos disputam título de tchutchuca do centrão

Arthur Lira - Elaine Menke/Câmara do Deputados
Arthur Lira Imagem: Elaine Menke/Câmara do Deputados

Colunista do UOL

29/11/2022 16h02

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Pedro Corrêa, que já foi o todo-poderoso do PP mas acabou cassado depois de seis mandatos no escândalo do Mensalão, tem uma piada que ficou famosa em Brasília. Dizia que tem três coisas que só ficam bem nos outros: sapato branco, óculos aviador e fama de ser de oposição.

Mais uma troca de governo e mais uma vez vemos uma brincadeira dizer grandes verdades. As paquitas políticas de Bolsonaro e Lula seguem se comportando como se estivessem diante de um grande inimigo e diferenças irreconciliáveis. Entre os políticos, no entanto, o pito toca de outro jeito.

O PT já decidiu apoiar a reeleição de Arthur Lira para a presidência da Câmara. É um desfecho inesperado para o partido que representa uma militância ativa no ofício de sommelier de bolsonarista arrependido.

O deputado nem arrependido está, mas já foi absolvido. Continua sendo fiel escudeiro de Jair Bolsonaro, o mesmo que esteve nos palanques eleitorais recebendo elogios rasgados do presidente.

Os principais dirigentes petistas atacaram Arthur Lira durante toda a sua presidência. Denunciaram, de forma acertada, a participação decisiva no acobertamento de todos os excessos e falhas do bolsonarismo durante a pandemia.

Falamos aqui de um legítimo representante do centrão, que conseguiu a maior vitória histórica do grupo, o orçamento secreto. Apesar dos malabarismos retóricos para justificar, é uma aberração que promete se sedimentar na política nacional e dar ao centrão o poder que ele jamais teve.

Jair Bolsonaro venceu as eleições de 2018 prometendo cortar as asas do centrão. Inesquecível a cena do general Heleno cantando "se gritar pega centrão, não fica um, meu irmão".

É possível fazer uma análise da prática sob o ponto de vista moral. Um grupo político abraça na primeira oportunidade tudo aquilo que repudiou e fez seus apoiadores. É algo que se repete em vários grupos políticos. Invariavelmente os apoiadores encontram justificativas para a situação, que passa a ser tratada como exceção e não como a regra que é.

Seriam os apoiadores pobres vítimas enganadas? Não são crianças. Têm os fatos e elementos para fazer análises mais adultas e realistas, optam por não fazer e idolatrar políticos.

Como entender o pessoal que está até agora tomando chuva e usando banheiro químico na porta de quartel? Nem eles sabem o que querem. Sabemos o que não querem, a posse de Lula, eleito de forma legítima. Mas o que querem, afinal?

Querem garantir a democracia por meio de uma intervenção militar. Querem uma luta contra o establishment liderada pelo presidente que mais espaço e poder deu ao centrão, representante por excelência do establishment político.

Acabam se arvorando numa pauta moral para justificar o injustificável, a defesa de um ideário que não para em pé. Acreditam que o lulismo é a representação do mal que precisam combater e eles, os bolsonaristas mais aguerridos, são a representação do bem.

Essa última crença é partilhada com os lulistas fanáticos. Acreditam que o bolsonarismo é a representação do mal que precisam combater e eles, os lulistas, são a representação do bem.

Nessa dinâmica moral, tudo o que se faça para prejudicar o grupo oposto é permitido e positivo. Ainda que essas atitudes sejam a repetição exata das atitudes do grupo inimigo.

Enquanto agem de forma violenta e apaixonada, os políticos que defendem travam uma disputa ferrenha pelo título de tchutchuca do centrão.

Não porque desejem, ninguém quer submeter o próprio poder a outro grupo. O modelo do presidencialismo de coalizão deixa o mandatário entre a cruz e a espada, entre o mensalão e o orçamento secreto, sempre no colo do centrão.
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