Mariana Sanches

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Reportagem

No G7, Lula critica ataques de Israel ao Irã: 'Consequências inestimáveis'

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva discursou hoje, diante dos líderes do G7, o grupo de países mais industrializados do mundo, e optou por confrontar diretamente o comunicado conjunto divulgado pelo fórum na noite desta segunda, em Kananaskis, no Canadá.

No documento, os chefes de Estado dos países ricos endossaram "o direito de defesa de Israel", que tem se traduzido em ofensivas militares contra Gaza e Irã, e culparam o Irã como "principal fonte de instabilidade e terror" no Oriente Médio.

Já Lula afirmou que "os ataques de Israel ao Irã ameaçam fazer do Oriente Médio um único campo de batalha, com consequências globais inestimáveis".

O brasileiro disse ainda que "nada justifica a matança indiscriminada de milhares de mulheres e crianças e o uso da fome como arma de guerra" em Gaza.

Embora os líderes do G7 tenham pedido um cessar-fogo no território palestino, o movimento seria condicionado "à resolução da crise iraniana".

A redação do comunicado era tão ambígua que o presidente americano Donald Trump e o líder francês Emmanuel Macron discordaram sobre o que tal solução significaria.

Trump deixou o encontro do G7 ainda na segunda, às pressas, em um movimento que Macron interpretou como o início de negociações de paz. "Os EUA garantiram que encontrarão um cessar-fogo e, como podem pressionar Israel, as coisas podem mudar", afirmou. E foi contradito pelo próprio Trump pouco mais tarde: "seja propositalmente ou não, Emmanuel sempre erra."

Nesta terça, Trump emitiu sinais na escalada de conflito com o Irã, e já apoiou a retirada definitiva dos palestinos de suas terras. Lula não deixou espaços para ambiguidade em suas posições, em um recado para os Estados Unidos de Donald Trump, que não estava na sala, como anteriormente esperado.

Ainda há países que resistem em reconhecer o Estado palestino, o que evidencia sua seletividade na defesa do direito e da justiça.
Luiz Inácio Lula da Silva, presidente do Brasil

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Mas os recados do presidente brasileiro a Trump não se esgotaram aí. De fato, ele passou a maior parte de seu breve discurso concentrado nos temas de "transição energética"e mudanças climáticas.

"A mudança do clima não espera, nem pode ser combatida sem esforço coletivo", disse Lula, em crítica não apenas a Trump, que retirou os EUA do Acordo de Paris, como também aos países ricos que têm sistematicamente falhado em financiar os esforços das nações em desenvolvimento em direção à economia verde e os seus serviços de conservação ambiental.

Lula voltou a lembrar que o Brasil tem mais de 90% de sua matriz energética elétrica de fontes limpas e o segundo maior produtor de biocombustíveis.

É impossível discutir a transição energética sem falar deles [dos biocombustíveis] e sem incluir o Brasil
Lula

A intenção do presidente é deixar o evento com o compromisso de que os 17 líderes presentes no evento de hoje se comprometam a participar pessoalmente da COP30, em Belém, em novembro.

Ao abrir os trabalhos, antes da fala de Lula, o anfitrião canadense Mark Carney qualificou a reunião como a "sessão mais importante dos dois dias" do atual encontro do G7. Foi preciso que os líderes aguardassem alguns minutos até que problemas na tradução simultânea pudessem ser superados e Lula tivesse a chance de compreender a deferência nominal de Carney a ele, qualificando-o como "chefe da COP30".

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"Temos uma agenda muito importante juntos, é um sinal de maturidade do G7 que nos unamos (para tratar de) problemas comuns em segurança energética, oportunidades comuns em novas tecnologias, a necessidade de suprimentos confiáveis e minerais críticos que esta mesa pode produzir e maneiras de encontrar parcerias para o verdadeiro desenvolvimento e, sob seu controle, presidente Lula, desenvolvimento sustentável", afirmou Carney, no único trecho do encontro que a imprensa pode acompanhar.

Em sua intervenção, Lula disse ainda que "não repetiremos os erros do passado", ao privilegiar a prosperidade econômica às custas da devastação de biomas como Amazônia e os fundos marinhos. O tema é sensível para o próprio governo do petista, que trabalha para liberar a exploração de petróleo na Foz do Amazonas.

Ele exortou os países a trabalharem em conjunto, novamente em uma crítica direta à retórica de Trump de que os EUA têm sido explorados por aliados e à guerra tarifária iniciada pelo republicano, que tem gerado instabilidade econômica global.

Parcerias devem se basear em benefícios mútuos, não em disputas geopolíticas. Se a rivalidade prevalecer sobre a cooperação, não existirá segurança energética
Lula

O presidente brasileiro afirmou também que para alcançar a "segurança energética" é preciso resolver conflitos e atuar pela estabilidade e paz no mundo. E citou o exemplo do Haiti, que enfrenta uma grave crise como Estado, como uma falha sistêmica da comunidade internacional em oferecer soluções.

"Não subestimo a magnitude da tarefa de debelar todas essas ameaças. Mas é patente que o vácuo de liderança agrava esse quadro. É o momento de devolver o protagonismo a ONU", em uma mensagem tradicional da diplomacia brasileira.

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Embora o teor do discurso possa ter sido duro e incômodo para alguns dos presentes, Lula protagonizou momentos descontraídos durante a reunião do G7. No momento em que os 17 líderes se reuniam para fazer uma foto juntos, o presidente brasileiro se entusiasmou em um diálogo com Antônio Costa, o presidente do Conselho Europeu. "Lula, Lula, a foto", chamou um risonho Macron, secundado por Carney. Lula então olhou pra frente e fez um joinha com as mãos enquanto o registro fotográfico acontecia.

Além do discurso, Lula teve uma reunião bilateral com o Canadá, e conversas mais ou menos informais com os líderes de Coreia do Sul, Lee Jae-myung, Índia, Narendra Modi, México , Claudia Sheinbaum e África do Sul, Cyril Ramaphosa. Um atraso de cerca de uma hora na programação do evento, atribuído pelo Planalto à organização do G7, inviabilizou a bilateral esperada entre Lula e o ucraniano Volodymyr Zelensky, e a reunião com o chanceler alemão Friedrich Merz, que partiu antes do brasileiro. Lula deixou Kananaskis às 19h30 no horário de Brasília, sem falar com a imprensa, como previsto anteriormente.

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