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Mauricio Stycer

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Globo sabe que "O Caso Celso Daniel" pode ser usado como arma na eleição

Colunista do UOL

28/01/2022 07h01

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O assassinato de Celso Daniel, então prefeito de Santo André (SP), completou 20 anos agora em janeiro. A polícia civil concluiu que ele foi vítima de sequestro seguido de morte. Já o Ministério Público acreditou na hipótese de crime político, uma trama que envolveria corrupção para beneficiar o PT.

Nesta quinta-feira (27), o Globoplay lançou os dois primeiros episódios de "O Caso Celso Daniel", uma série documental pensada originalmente em 2016 e desenvolvida desde 2017, segundo a produtora Joana Henning.

É muito difícil assistir sem pensar sobre o "timing" deste lançamento justamente em um ano eleitoral que tem tudo para ser muito quente. A abertura do primeiro episódio deixa claro que Henning e a Globo sabem que a série tem grande potencial para ser usada como arma política ao longo de 2022.

Numa colagem de falas de figuras que têm alguma relação com o caso, o então presidente do PT, José Dirceu diz: "Não pode ser coincidência tantos assassinatos, tantos atentados, tantas ameaças". Em seguida, o então governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, aparece dizendo: "Não vou transformar essa tragédia em discurso político". E, na sequência, Lula, então presidente de honra do PT, diz, criticando o governo do Estado: "É inacreditável o descaso, o desleixo."

A abertura termina com a montagem de três outras frases. Na primeira, Álvaro Dias pergunta, num debate presidencial, em 2018: "Quem mandou matar Celso Daniel?" Em seguida, Marcos Valério, operador do "mensalão", aparece diante de um juiz e diz: "Eu gostaria de não responder a esta pergunta porque o que fiquei sabendo é muito grave". E Lula surge novamente, encerrando o jogral: "Toda vez que vai chegando perto de ano eleitoral, esse caso volta à tona".

Gilberto Carvalho, que trabalhou em diferentes governos petistas, incluindo a Prefeitura de Santo André, observa no documentário que Celso Daniel tinha uma relação muito cordial com Alckmin, mas que a relação entre PT e PSDB era "tensa" na época.

Ainda no primeiro episódio, Lula critica a demora de Alckmin em reagir à informação de que Celso Daniel havia sido sequestrado. Ele queria que a polícia fechasse todas as entradas e saídas de Santo André imediatamente após o crime. Alckmin surge em seguida, falando de todas as providências que tomou.

No segundo episódio, há mais críticas do PT a Alckmin e do PSDB ao PT. Primeiro, Fernando Henrique Cardoso se recorda do encontro que teve com Lula e José Dirceu no Palácio do Planalto para tratar do caso e ironiza: "Você não pode tomar ao pé da letra o que um político diz. Ele (Lula) diz porque interessa dizer numa certa hora. 'Vim aqui tomar satisfações'. Não, ninguém toma satisfações do presidente da República". José Dirceu diz em seguida: "Nós não confiávamos no MP, na Polícia Civil e no governo. Era necessário um controle externo sobre as investigações".

A polícia estadual também é criticada por José Genoíno ("Dão muitas entrevistas") e pelo advogado Luiz Eduardo Greenhalgh, do PT, e defendida pelo então governador.

A série tem oito episódios e o Globoplay promete colocar no ar dois episódios a cada semana ao longo de um mês. Erick Brêtas, diretor de mídias digitais da Globo, foi questionado num evento para jornalistas sobre o "timing" do lançamento e negou que a empresa tenha algum interesse político no caso. Mas reconheceu que a série pode ser usada na campanha eleitoral.

"Nós não temos agenda. Essa obra está sendo lançada agora porque a gente entende que jogar luz sobre pontos importantes, polêmicos, não esclarecidos ou até esclarecidos, mas que sempre voltam - porque as pessoas podem ter um interesse em trazer esse assunto de volta para o clima eleitoral -, é importante a gente jogar luz nessas questões", disse.