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Mauricio Stycer

REPORTAGEM

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The Noite deixa piadas de lado por 40 minutos para falar da guerra

Danilo Gentili, apresentador do The Noite, no SBT, que estreou nova temporada esta semana - Divulgação/SBT
Danilo Gentili, apresentador do The Noite, no SBT, que estreou nova temporada esta semana Imagem: Divulgação/SBT

Colunista do UOL

10/03/2022 07h01

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Lançado em 2014, o "The Noite" se consolidou como um clássico programa de entrevistas de final de noite, com ênfase no entretenimento e no humor. Sob o comando de Danilo Gentili, o talk show atrai um público jovem, vai muito bem no You Tube e produz muito engajamento nas redes sociais.

Ao estrear a nona temporada, nesta segunda-feira (07), Gentili advertiu os espectadores: "A gente vai começar o programa hoje um pouquinho diferente porque, infelizmente, nós temos um conflito completamente desnecessário acontecendo agora no mundo. A Rússia invadiu a Ucrânia". Seguiu-se, então, por quase 40 minutos, uma entrevista séria, sem nenhuma piada, com o cientista político Heni Ozi Cukier, o padre Lucas Perozzi, que está em Kiev, e o jornalista Sergio Utsch, correspondente do SBT, que está na Moldávia, cobrindo a guerra.

Mais cedo, a emissora havia enviado um comunicado à imprensa falando que em 2022 o "The Noite" vai tentar tratar de temas mais sérios ("um conceito atual, com teor mais jornalístico e com pautas quentes", nas palavras do SBT). Foi para entender melhor esta proposta que entrevistei João Mesquita, diretor-geral do programa:

O "The Noite" está anunciando que em 2022 buscará apresentar "teor mais jornalístico e com pautas quentes". Poderia dizer o que está motivando essa decisão?

João Mesquita: Devido a estrutura e planejamento para o "The Noite" se manter na pandemia, tivemos nos últimos dois anos programas mais "frios". Apesar de contextualizarmos sempre o período que vivíamos, nem sempre as entrevistas eram feitas do dia para o dia, devido o risco frequente de perder um convidado ou não ter o apresentador. No caso do Danilo, perdemos ele duas vezes no ano passado por problemas médicos. Além disso, a ausência da plateia fez com que cortássemos o monólogo da estrutura do programa.

Com a volta da plateia e a volta da equipe em funcionamento padrão, nossa ansiedade por ter um programa mais fresco aumentou. Então consideramos um programa mais quente, com mais assuntos atuais. Isso não faz necessariamente a linguagem do programa mudar. O teor jornalístico entra no "The Noite" quando o assunto se fizer necessário. Como exemplo, a guerra na Ucrânia. Para balancear e manter o público que busca se entreter com a gente, colocamos no mesmo programa uma rodada da noite com humoristas comentando o constrangedor áudio do deputado Arthur do Val.

Somos um programa diário com 214 edições neste ano. É válido o "The Noite" algumas vezes falar um pouco mais sério e expor um assunto diferente e necessário dentro da nossa proposta. Já fizemos isso algumas vezes em outras temporadas. No programa da terça-feira, prestamos uma homenagem aos heróis que ajudaram tanto no desastre em Petrópolis. Aliás, uma pauta particularmente pedida pelo Danilo. Serão historias inspiradoras daqueles que ajudaram o país. Após a entrevista, tivemos a estreia do "Fator The Noite Kids". Um quadro divertido e novo para o nosso público. Ou seja, dá pra mesclar! Faz bem!

Silvio Santos disse em 2017 que Gentili e Raquel Sheherazade não podiam opinar sobre política em seus programas. O anúncio de uma pauta mais quente e jornalística significa que essa proibição caiu?

João Mesquita: Danilo não foi proibido de falar de política. Ele tem suas redes e é livre para falar sobre o que quiser como pessoa. Assim segue. Constantemente está lá questionando o que acha necessário, seja no Brasil ou no mundo. O "The Noite" é um programa do SBT e sempre seguiu as diretrizes da casa. Não é de hoje que a recomendação para a linha de shows não abordar temas essencialmente políticos existe. Creio que nem foi em 2017 que isso começou, foi bem antes. O "The Noite" faz parte da linha de shows da emissora e a recomendação foi seguida. Queremos ter um programa atual, porém não seremos um telejornal. Não temos estrutura, tempo, nem público para isso. Assistam à temporada que estamos preparando e garanto que vão gostar das nossas abordagens.

O "The Noite", com uma aposta numa pauta mais de entretenimento, sempre se diferenciou muito claramente do "Conversa com Bial". Este ano, os dois programas estrearam com assuntos sérios: a Guerra da Ucrânia no SBT e a situação política do Brasil na Globo. Não temem que o público do "The Noite" reclame?

João Mesquita: Se queremos um programa que, além de entreter, fale sobre as atualidades do mundo, não temos como fugir do tema da Guerra na Ucrânia. E o assunto, dentro da pauta que achamos interessante fazer, não cabia piada durante a entrevista. Serão 214 programas nessa temporada e podemos assim transitar sobre o tom que vamos adotar nas pautas. Isso é bom! Faz parte.

Agora, se não cabe piada na entrevista, ela estará no monólogo ou no próximo bloco. Humor não vai abandonar o "The Noite", é a nossa identidade e é o que o público primordialmente procura. É um desafio gostoso pra gente e atrativo para o público.

Por mais que pautas sérias e classificadas como "jornalísticas" aconteçam, estamos muito longe da proposta do Bial. No programa da Globo, temos um jornalista extremamente respeitado com uma linguagem mais contida e temas sérios praticamente todos os dias. Não será o caso do "The Noite". Quando por ventura tivermos assuntos parecidos, você verá um apresentador que trará esses mesmos assuntos com uma linguagem mais popular.

Isso não é novidade no "The Noite". Já fazia parte do nosso escopo antes da pandemia. Só queremos destacar que estamos reativando isso! Sobre temer as queixas do nosso público? Faz parte. Afinal é um público muito variado e nunca agradamos 100%. O "The Noite" quer sempre fazer rir, mas também podemos informar e emocionar. Foi assim que nos consolidamos e assim que conquistamos as 233 vitórias sobre a Globo nos oito anos de programa.


Pra esquecer
A Rússia adotou uma nova lei para, segundo o governo, combater notícias falsas. A lei intensifica ainda mais a censura à imprensa e coloca em risco jornalistas russos e estrangeiros trabalhando no país. Por este motivo, TVs, rádios e outros veículos de mídia independentes suspenderam suas atividades e empresas estrangeiras, como o The New York Times, deixaram a Rússia. Putin trata a guerra como "operação militar especial".

Pra lembrar
O jornalismo na televisão aberta, de um modo geral evita manifestar opiniões. Mas em algumas circunstâncias, parece inevitável dizer o que pensa. No caso das declarações machistas e sexistas do deputado estadual Arthur do Val (Podemos-SP), que será alvo de investigação da Assembleia Legislativa, o "Jornal da Band" achou necessário dexiar claro o que pensa. "Se ele não consegue respeitar o sofrimento de refugiadas, e muitas sofrem com a violência sexual em meio a uma guerra, então não é digno de representar as mulheres que votaram nele".

A frase
"Testemunhei muitos horrores nos últimos 20 anos cobrindo guerras, mas o ataque intencional a crianças e mulheres é puro mal"

Lynsey Addario, fotógrafa de guerra há mais de duas décadas, após registrar a imagem de uma família ucraniana (mãe e dois filhos) morta por morteiros russos durante fuga da cidade de Irpin.

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